EM BUSCA DO SENHOR
Quando ele viu fechada
a aberta porta da Igreja
pressentiu que Jesus de Nazaré
se materializaria para ele
no vértice da cruz
símbolo maior de sua agonia.
Então marchou resoluto
para a Estação Rodoviária
centro geográfico da urbe
onde o eixo monumental
trespassado pelas asas norte e sul
desenha a cruz da cidade.
Crucificação, crucificção
sacrifício, sofrimento
numa repetição trágica
da via crucis do Senhor.
E viu rostos mutilados,
mendigando amor e dinheiro
viu crianças famintas
abandonadas,
a um passo do delito.
Viu pessoas apressadas
outras estacionadas
sem ter nada o que fazer.
E viu mundanas e michês
batalhando a sua caça
evitando a polícia
que estraga a sua féria.
E viu rostos sofridos
marcados pelo desemprego recente
viu burgueses circunstantes
maldizendo o itinerário
desagradável e inusual.
E viu chegantes esperançosos
de arrumar as suas vidas
enquanto outros, na pior,
tristes, desiludidos
pediam a caridade alheia
para a passagem de volta.
E viu trombadinhas algemados
conduzidos por policiais
estudantes maldizendo a ditadura,
velhinha brigando pelo troco
domésticas bolando o passeio
de domingo no parque
da água mineral.
E viu recrutas perambulando
gozando a folga dos quartéis.
Viu também maloqueiros,
homens machos e entendidos
traficantes, viciados
bêbedos trôpegos
e bêbedos discretos
parados com o olhar distante
e triste.
E viu criaturas desesperadas
suicidas em potencial.
Viu muitos trabalhadores
tomando caldo de cana
com o pastel tradicional.
Enfim, uma amostra do povo
de incluídos a excluídos
de apartados a segregados
todos na busca incessante
da paz perdida.
Em todas as fisionomias
pressentiu fome de amor
carência de afeto
sede de ternura
e uma esperança salvadora
de libertação.
Foi quando enxergou o Cristo
ali mesmo materializado
nos fragmentos de vida
daqueles perfis sofredores.
Estava, sim, visível a qualquer mortal
que se dispusesse a unir
as peças do quebra-cabeça.
Brasília, novembro de 1980
Quando ele viu fechada
a aberta porta da Igreja
pressentiu que Jesus de Nazaré
se materializaria para ele
no vértice da cruz
símbolo maior de sua agonia.
Então marchou resoluto
para a Estação Rodoviária
centro geográfico da urbe
onde o eixo monumental
trespassado pelas asas norte e sul
desenha a cruz da cidade.
Crucificação, crucificção
sacrifício, sofrimento
numa repetição trágica
da via crucis do Senhor.
E viu rostos mutilados,
mendigando amor e dinheiro
viu crianças famintas
abandonadas,
a um passo do delito.
Viu pessoas apressadas
outras estacionadas
sem ter nada o que fazer.
E viu mundanas e michês
batalhando a sua caça
evitando a polícia
que estraga a sua féria.
E viu rostos sofridos
marcados pelo desemprego recente
viu burgueses circunstantes
maldizendo o itinerário
desagradável e inusual.
E viu chegantes esperançosos
de arrumar as suas vidas
enquanto outros, na pior,
tristes, desiludidos
pediam a caridade alheia
para a passagem de volta.
E viu trombadinhas algemados
conduzidos por policiais
estudantes maldizendo a ditadura,
velhinha brigando pelo troco
domésticas bolando o passeio
de domingo no parque
da água mineral.
E viu recrutas perambulando
gozando a folga dos quartéis.
Viu também maloqueiros,
homens machos e entendidos
traficantes, viciados
bêbedos trôpegos
e bêbedos discretos
parados com o olhar distante
e triste.
E viu criaturas desesperadas
suicidas em potencial.
Viu muitos trabalhadores
tomando caldo de cana
com o pastel tradicional.
Enfim, uma amostra do povo
de incluídos a excluídos
de apartados a segregados
todos na busca incessante
da paz perdida.
Em todas as fisionomias
pressentiu fome de amor
carência de afeto
sede de ternura
e uma esperança salvadora
de libertação.
Foi quando enxergou o Cristo
ali mesmo materializado
nos fragmentos de vida
daqueles perfis sofredores.
Estava, sim, visível a qualquer mortal
que se dispusesse a unir
as peças do quebra-cabeça.
Brasília, novembro de 1980