O SILÊNCIO DO CENÁCULO

Depois daquela Ceia, os amigos

que estivemos ali naquela festa,

resolvemos ficar pr’ além da hora.

Uns levarão os restos aos mendigos,

outros farão a limpeza que se apresta

e que tudo se faça sem demora.

O Mestre já saíra antes da noite

e fora com os onze para o horto

para ali contemplarem as estrelas.

E nós, com nosso corpo feito açoite,

num estado de alerta meio torto

deixámo-nos dormir junto às janelas.

Cenáculo era o nome da Vivenda

doação que Arimateia com certeza

para os actos do Mestre obtivera.

Ali dormimos todos sem comenda,

seguros e de graça com justeza

e assim valeu a pena a nossa espera.

Acordámos na alta madrugada,

na porta mil pancadas com fragor,

chamando em altos brados por alguém.

Tiago e Mateus duma assentada

deram a triste nova com terror:

Jesus foi preso em Jerusalém!

Com estes dois, correndo, outros chegaram

vindo dar a notícia aos familiares

que logo s’ abraçaram já sem fala.

Nascida a aurora todos sossegaram

e juntos a Sua Mãe, deixando os lares,

saíram com temor em grande escala.

Sobre o Cenáculo caiu o drama,

à forte luz cerraram-se as janelas

e o gonzo daquela porta emudeceu.

A Mãe da Soledade já derrama

as suas lágrimas pelas vielas

e até o triste Judas ensandeceu...

Frassino Machado

In ODISSEIA DA ALMA

FRASSINO MACHADO
Enviado por FRASSINO MACHADO em 07/04/2007
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