Cadente

Eu vivia e respirava

Eu sussurrava e suscitava

Mas muitos não me ouviam

E quando ouviam sumiam ao entardecer de minha sombra na porta de meu quarto

Eu vivia sob um teto de chuvas, e eles diziam que somente a terceiros amavam

E eu sequer interpretava uma meia-linha de suas ironias em forma de mísseis

Eu tinha flores em meu jardim, e meu sorriso era sempre como o de uma criança feliz

Eu era o Sol sobre sua cabeça desalinhada

Eu era o caminho mais curto, mais prático e divertido que você poderia percorrer

E você semeava pedras e mais pedras, buracos e mais buracos, escavando-me a fundo

Eu era doce como um néctar colhido pela manhã

Eu era a vítima de alguém que me tinha como alvo de amor

Mas um aperto de mão sequer já ilustrava meu livro de saudades

Eu era indomado e na força sobre minhas costas,

aprendi a me curvar a quem antes me amamentava

eu tinha um amor que eu mesmo colhia e capturava quando bem quisesse

mas aprendi dia-após-dia a ser servil e furtivo como um a um ordinário pardal

-e não havia mais copo de água que me fizesse crer em suas palavras

Não havia mais pedido de clamor e olhos enrugados e arrependidos

ao me ver caído no meio da sala –

eu já não estava mais lá

e meu filme pessoal de quase 100 anos já havia se passado

nunca há chance de se fazer parar a flecha após ela ser lançada

prefiro cozinhar minha raiva em mim mesmo, do que levá-la até você

nem que pra isso custe minha própria vida

carregou boa parte de meus artifícios de Fé

destruiu minha intimidade ao assinalar quais opções eu deveria seguir...

...responde por mim mesmo tudo o que eu deveria parar e pensar...

Infringe minhas regras mais íntimas de “como jamais me anular”

Mata meu interior, colhe meus glóbulos de Luz Divina e me mata com seu olhar

Mas ainda assim estou vivo, pronto pra te amar

Como uma louca, ignóbil, teimosa e animalesca criança bestial

Você faz o Bem e o Mal, em uma inconseqüente dança de sentimentos

Não sabemos pra que lado correr, Mãe Terra

Você se mata e nos mata

Você se autodestrói e nos faz ver a morte por perto

Você torna-se o símbolo mais eloqüente de falsidade e enganação

Mas ainda assim procuro ver em você alguém que nos salvaria de repente!

Não espere que eu suporte, não espere que eu agüente toda essa sua chama

Não espere que eu me mantenha firme sem lhe dar umas bofetadas

Podem ser as últimas em minhas energias

Eu era Único e Seu, somente seu

E como a uma estrela cadente essa sua atmosfera me reduziu à História, apenas.