Fragmentos II

Muito tempo atrás, um padre havia,

Habitante da cidade de Castela,

Que, enamorado de cigana muito bela,

Decidiu, afoito, que a possuiria.

Vaidosa e orgulhosa, magnífica ave,

Assinalando o alto jaez do religioso,

Decidiu ceder ao cortejo ruinoso,

Que levou ao romance na sacra nave.

A tórrida paixão dura uma semana,

Pontuada por vinho e depravação,

Mimos caros facultando a aprovação,

Da luxúria primeva a reinar, soberana.

Algum tempo depois, eis que surgia,

O claro sinal da gravidez indesejada,

E a dama corre ao padre, transtornada,

Suplicando o apoio a que jus fazia.

Mas em sua batina negra como a morte,

O sacerdote é infame e calculista,

Brada, furioso, a situação malvista,

E abandona a garota à própria sorte!

Humilhada e vencida, a linda cigana,

Ventre repleto, seu fruto enjeitado,

Segue destino a paradeiro ignorado,

Tornando venturoso o padre, em sua gana.

Viveu ainda vários anos, o detestável,

Sermoando aos domingos o Livro Sagrado,

Mas só entendeu o que fizera de errado,

Quando veio ao mundo só e miserável.