EXTENUE

Carrego no corpo,

hoje,

o peso

da rigidez cadavérica

daqueles que nunca amaram

ou nunca foram amados

eu não fui,

se fui,

tão pouco foi

que pouco ou nada senti

fiquei ali

embalando minha ausência de sentimentos

sem fúria

numa rede puída

Total inércia

de interagir

sei amar

ao menos,

pensei que sabia,

quando adotei

um animal de rua

ele

tanto quanto eu

dele

queria um tanto

de mim

diziam que preenchia os espaços

que a gente tinha vazios,

Mas ele e

eu

queríamos tanto

quanto tantos querem

sem dar

Assim como o corpo,

também o coração

Meus olhos secaram

de lágrimas

e,

desconfio que até minha alma partiu

para longe das vistas humanas

e por falar em vistas

das minhas

uma apagou

e o alcance da que restou

não vislumbra o horizonte

desaprendi

a olhar para frente

acostumei-me a olhar

para os pés

e o umbigo

Mas hoje,

olho

para cima

deitado aqui

nesta mesa

fria

do necrotério

pois deitado estou,

deitado para sempre ficarei

até que tudo apague

desapareça

consumido pelo ar e pelos vermes

e eu volte a ser o que sempre fui

matéria orgânica

e energia

pode ser que eu

reascenda

volte do céu

numa grande explosão provocada

acima da cabeça dos humanos

como o faz

a chuva de fogos de artifício

e eu me caia,

leve,

sobre o corpo de cada um daqueles

que não amaram

talvez eu os cure da insensibilidade

ou ainda,

como energia renovada

eu os contamine

com um novo vírus

o vírus do amar o outro

como a si mesmo

Rara orquidia negra
Enviado por Rara orquidia negra em 28/07/2011
Código do texto: T3124988
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