Alma Gêmea
É madrugada e é silêncio no meu quarto...
Uma saudade toma conta de mim, antes indeciso,
entre as saudades que permeiam a minha vida.
Mas é algo longe, muito longe, uma névoa
sobre uma emoção que insiste em voltar
nestas horas tão paradas do meu tempo...
E é uma saudade tão grande, tão intensa,
tão impossível de se expressar por palavras!
Que palavra traduz o indizível?
Não sei que nome tem esta saudade,
Nem mesmo sei se preciso dar-lhe um nome...
Mas como terá sido esta saudade?
Rolou comigo pelos abismos insondáveis
das quedas estupendas, dos vôos inacabados,
ou subiu, alçou-se à luz,
Que o verme cega e amedronta?...
Onde te deixei, saudade minha:
nas cortes feéricas dos soberanos do mundo,
nos suores e lágrimas dos deserdados da sorte
ou nas pesadas sombras das muitas Inquisições?
Vislumbro os sóis escaldantes dos desertos
onde sangramos os pés nas muitas caminhadas...
Também vislumbro as montanhas gélidas e brancas
onde sepultamos os nossos muitos corpos...
No meio, flechas, lanças e baionetas,
aroma de pólvora,
odores de sangue, suores e lágrimas,
séculos de amores e de ódios,
esplendidas visões, tétricas figuras!....
Que nome tens hoje, saudade minha?
Onde habitas, longe dos momentos
em que a minha emoção vai resgatar
a tua turva e remota memória?
Um dia, ouvi alguém dizer:
"Sinta este momento".
Obedeci. E me senti
alçado a um céu.
Eras tu que me falavas?
No fim,
uma grande, clamorosa e inquietante dúvida
me estremece o peito:
Quem sabe já em insuspeitado corpo,
e numa imprevista cena do Teatro da Vida,
te reencontrei e não te reconheci?!...
Antonio Maria/São Luís do Maranhão, 07/03/1994