ÚNICA ALMA
Minha mão a chave alcança,
e eu, feito curiosa criança,
entro adentro salão vazio,
escuto apenas a alma do frio
a gemer n'algum canto escuro,
como hera do outro lado do muro
a supor venturas do lado de lá,
onde nunca poderia estar.
Vago torpor de ventilador ligado,
ouço meu nome em vago lamento,
um não sei o quê deixa-me tomado,
e sou, por um mínimo momento, amado...
Avisto os cachos de cabelo em ondas,
olhar aflito que nasce das sombras,
pede-me água, pão e sentimento,
dou-lhe o que pede em pequeno tempo,
e o sangue rubro sobe-lhe às faces,
naquele instante o entendimento nasce,
sobressalto-me por reconhecer tal rosto
como antiga foto em documento posto,
levanta-se ela e murmura-me em doce calma:
Anda, apressa-te, sou eu, tua única alma.