Tia solidão

No tempo de infância achava

Que solidão era uma tia chata, pois

Minha tia boa sempre reclamava dela

Dizendo não prestar.

Ela dizia que criança não passava por

Isso, que mesmo sozinha a gente dava

Um jeito inventava personagens travávamos

Monólogos, e pronto! Solidão não chega

perto de criança, eu nunca nada disso entendi.

Mas o tempo foi chegando ou passando

E tia boa foi virando criancinha, pois já era

Comum ela rindo e discutindo sozinha, então

Percebi que ela também já não via solidão.

Não entendia mamãe, ao ver minha tia boa

Sorrir, chorava, rogava, olhava para o céu,

Murmurava, seria para cegonha

Trazer-me um irmão? Mas quando a olhava

mamãe despistava e limpava o rosto com o

avental dizendo que as lágrimas eram

cebolas, imaginava quantas tinham dentro

dos seus olhos.

Um dia tia boa gritou, chorou a noite

Inteira e pela manhã só havia silêncio.

Não a vi na hora do café aproveitei

Tomei meu leite com chocolate na sua

Xícara, e mexi com sua colher que tinha

Flores no cabo.

Logo o agito todo recomeçou, telefone

Gritou e formou-se correria, minha prima

Mais velha cuidou de mim o resto do dia, até

Que de retorno a casa mamãe e papai vinham

Derramando cebolas.

Logo vieram alguns homens, vizinhos que reconheci,

Eles traziam uma caixa grande maior que as que

Minha prima usava para brincar de boneca.

Destamparam a caixa marrom, dentro cheia de flores,

E minha tia boa estava lá, deitada com os braços

Cruzados no peito, engraçado! Ela sempre

Descruzava quem daquele jeito via, pois

Dizia que dava azar.

No meio daquelas flores coloridas minha tia boa

Ria, pois se via em seus lábios traços de alegria,

Talvez fosse porque pela primeira vez em toda

Minha vida eu a vi não brincando de boneca,

Mas deitada na casa de bonecas coberta de flores.

E ao lado tinham outras flores em forma de pneus.

E nesse dia que

Foi o ultimo em que a vi ela não reclamou mais da tia solidão.

Paulo Valadares

17/01/07

Paulo Valadares
Enviado por Paulo Valadares em 11/05/2008
Reeditado em 21/01/2011
Código do texto: T984565
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