vinte anos
Vinte anos
Vinte miseráveis anos
Lixiviação intensa
Lixando tudo, alma, corpo, lágrimas
e vida.
Vinte mil vezes
tentei percorrer o mesmo
caminho por
onde deixei pegadas
e me perdi no labirinto torpe dos
vestígios
Eu não me lembro mais como eu era
Eu não me lembro mais como era você
Só sei que não era isso...
Vinte anos
Minhas pálpebras sonham com a visão,
E tudo que vêem é esse inferno
ensaiado e vaiado por minha trilha sonora interior
Vinte anos
E tudo que temos em comum
É um recíproco estranhamento
Uma quase-aversão
Raspando na parede os ódios cotidianos
a paranóica sensação de frustração.
Vinte anos
Vinte mil anos
Nunca mais vou ter paz
A certeza me amedronta
Faz as pernas tremerem.
Pareço uma garça trêbada
A se entorpecer com a própria tristeza
Esse enorme marasmo
composto de pântano e
poluição
Por que o branco das garças é tão deprimente?
Por que tanta ausência ainda dói?
Respostas insanas e lúdicas
aparecem ao vento,
as músicas que embalam sonhos e pensamentos
não respondem às agonias antigas
Rezo todos os dias
para isso ter fim
ainda que o fim, seja o fim-do-mundo
mas será o fim secreto
de todas as mazelas,
será o fim das decepções.
Talvez surja alguma esperança
Ainda que no solitário entardecer
sangrando pelo horizonte a fora
anunciando baixinho a noite
repleta de mistérios e ansiedades.
Vinte anos.
Vinte primaveras.
Mas só me lembro da severidade dos invernos
As flores murcharam ou simplesmente
não desabrocharam
os frutos verdes morreram no pé
como devem morrer os guerreiros,
os monges e os poetas.
Todos nós ainda seguram aquela
lanterna de Diógenes
a procurar um homem bom e idôneo...
uma alma limpa, imaculada
e incorruptível.