Eu ando demais
Sem redondilhas,
De todas essas ilhas,
Andei por mil milhas,
Mil reencarnações de vidas andarilhas.
Ando, ando, sem parar,
Até porque parar não é opção,
E eu opino severamente em parar,
Mas não deixam os passos do coração.
Andei em sol escaldante,
Agressor de todo andarilho,
Mantendo andar tão petulante,
Nessa vida andei como filho.
Se tropeçar, logo me reergo,
Se eu errar, logo me reescrevo,
A vida nunca parou pelos erros da humanidade,
Não vai parar pela minha falta de vontade.
Queira eu errar, chorar e cair,
Ficar ali, enquanto todos passam,
Sou invisível, ninguém vê o meu ferir,
Se não tiver lugar na calçada, me amassam.
Passos largos e lentos na avenida,
Pensando em uma viagem só de ida,
Não voltaria nem pelos sinais,
Nem pelas ruas mais vitais.
Minhas pernas doem,
Enquanto espero o céu nublado,
Meus pés doem,
Mesmo quando não estou errado.
Espero semáforos alaranjados,
Ou seriam amarelados,
Me distraio sob os carros,
Todos esperando os seus marcos.
Nos dias nublados,
Quando estão todos calados,
Se chover, se chorar,
Deixa molhar.
Então deixa chover,
Deixa molhar,
Deixa escorrer,
Deixa pingar.
Dias com sapatos sociais,
Dia com tênis surrados,
Com meus fones antissociais,
Com ombros cansados.
Se for andando na noite sombria,
Eu espero tua fala na escuridão,
Se não for falar, sorria,
Sei que não me escolheu essa solidão.
Ando sob as trilhas,
Ando sob as brumas,
Não me leia nas entrelinhas,
Nem procure nas minhas dunas.
Ando descalço sem acusar som,
Seria maldição,
Seria dom,
Se não te assustasse tanto, seria bom.
Ao fim do dia o pé dói,
Como um cobertor que se foi,
Não se esqueça jamais,
Que eu ando demais.
No meu mais turbulento dia,
Eu penso demais,
Quem sabe um dia a vida,
Venha me trazer paz.
Como uma vez, há dito essas palavras,
Não descansará até o dia de não andar,
Seja sob fogo ou navalhas,
Eu continuo a marchar.
Eu ando demais,
Eu trabalho demais,
Eu canso demais,
Eu vivo demais.