LAMENTO DA MADRUGADA

Foram tantas dores e poucos prazeres

Sentidos naquelas madrugadas;

De tantos pensares, poucos quefazeres

Na tormenta de horas atribuladas;

Que na escuridão da paz

Me vi pedindo a Deus

Coisas que jamais pedi,

Coisas que só quando pedi,

Percebi que havia feito tal pedido,

E logo em seguida me intriguei.

E descobri-me perguntando:

"Como tive coragem de pedir isso a Deus?"

Mas logo, de pronto, me aprumei.

Não era pra ficar envergonhado.

Cada um sabe a dor que está sentindo

E na hora do sofrimento,

Em meio ao próprio lamento,

Não se escolhe o pedido.

O pedido é que te escolheu.

Ou o incômodo ou a dor ou o sofrimento.

E nesse momento

Ocorre o exercício da fé.

Cada qual sabe qual é.

Ninguém pode usar a fé do outro.

Cada qual usa a fé que tem.

Então, é o Deus de cada um, que ouve a petição .

Aquela que vai surgir do profundo do coração

Ou da sua dor.

Então, não há pedido certo ou errado.

E não há indivíduo dissimulado

Na hora do tormento.

Cada qual com o seu lamento,

Cada qual com a sua dor.

E somente um Deus de amor

Para a todos atender.

Só Deus pode responder

Ao clamor do servo seu.

Seja rico ou seja pobre,

Seja simples, seja nobre,

Seja de que jeito for:

A todos Deus atende,

Se encontra coração crente,

Naquele que está a pedir.

Foi naquela madrugada

Que minha fé foi pra estrada

E caminhou com vigor.

Minha alma abandonada

Bateu em retirada

Na direção do Senhor.

E em tal circunstância

Desprovida de qualquer beleza

Pela própria natureza

De dor e de sofrer.

Minh'alma enxergou a tua Luz,

Iluminação, clarão,

Contradizendo a Razão,

No exercício de minha fé.

E na madrugada silente,

Meu lamento de crente,

Embrulhado nas lágrimas.

Apresentou-me Jesus,

Seu sofrimento na cruz,

No lugar que era meu.

Levando todas as dores

Da humanidade perdida,

Nas trevas decaída.

Necessitando de Deus.

No silêncio da madrugada

A vizinhança imaginava

Inquieta com minha dor.

O que por aqui se passava.

Até que um dia na rua

Indo buscar socorro médico

Um deles me relatou:

Em casa, de madrugada,

Já ficando de orelha em pé,

Minha esposa perguntava:

"Que acontece com Josué?"

E eu tudo contei:

As dores da cirurgia

Todo o pós-operatório

As madrugadas insones

De dores insuportáveis

O reconhecimento inconteste

Da fragilidade humana

O bálsamo que vem da cruz.

E por todo o meu lamento

A oração do gemido

O clamor dos gritos, urros

Meu ser foi redimido

Meus pedidos de socorros.

Liberto de suas dores

O meu corpo curado

Por Deus transformado

No alívio da fé

Que persiste e não desiste,

Pois a todo a quem ama

Deus levanta com amor

Aliviando sua dor.