Hora Extra
Um jovem perdido
Um pensamento sofrido
Um novo milênio acabou de começar
Ainda assim as ruas quentes
Iluminadas por lâmpadas e enfeites
Morrendo de calor abaixo de anjos de Natal
Sentia medo de o que seria o amanhã
Não esperava o futuro, acordava de manhã
Preparado para prever que nada iria acontecer
Não havia sequer razão para sobreviver além dos dezesseis
Mas havia crescido e não era mais criança
Vivia apenas de mentiras e rancores de lembranças
A caça das bruxas o fazia temer o inferno e seus próprios pais
Outro casal mal afortunado que na fé tentava se abraçar
Um jovem perdido
Um pensamento sofrido
Outro ano acaba de terminar
As mesmas ruas quentes
Mas agora era diferente
Dezoito anos já ficaram para trás
Abandonou os templos daqueles que colocaram estaca
Os sonhos e aspirações foram sacrifícios para várias placas
Seus pais oravam fervorosamente para que se tornasse crente
Do mesmo Deus que ele nunca compreendeu de maneira coerente
Pecados pediam por uma libertação, ainda que se sentisse na razão
Ele não se sentia no direito de a seus pais culpar, então
Quem é que no fim do dia viria ser seu guia ou tentar te ajudar
Coragem era o que queria mas ninguém entendia que ele queria provar
Que era um jovem perdido
O arrependimento era sofrido
Mas no fundo, no fundo ele queria acreditar
Que se provasse ser bom
Admitiriam que ele teria algum dom
Algum valor, alguma verdade, algo para mostrar
A cada vez que estendia sua mão por bondade
Se sentia um ser sem nome e peso, apenas uma fraude
Pois os seus pecados eram muitos e a penitência era pesada
Vinte anos, vinte e dois, e se ser bom era divino fez tanto por nada
Então porque não apenas se entregar aos vícios e ilusão
Sempre será culpado por ter negado a acreditar em seu coração
Seja sóbrio ou regado a álcool, culpa, cigarros, pedidos de ajuda
Se vivia de hora extra desde os dezesseis, tanto faz sua postura
Já não era apenas um jovem perdido
Sua história era sempre querer ser ouvido
Mas nenhuma palavra queria mais falar
Seu dinheiro suado soava vil
Como sentir felicidade em um coração frio?
Ninguém o convencera que valia a pena encontrar
Outros meios de viver a vida sem ser se afogando
Embriagado de vodka e histórias de corações partidos
Não era como se tivesse algum valor para se sentir amado
Quando cresceu apenas temendo o inferno e este era seu passado
Se sentir diferente daqueles que lutaram, cresceram, amaram
Não tinha certeza onde é que ele mesmo errou mas passaram
Mais um Natal de puro calor bem como seu aniversário
Agora ele sabia que eram vinte e oito anos, se sentia culpado
Não era mais jovem, apenas sofrido
Fumando e se destruindo, vivendo pelos amigos
Os que ainda assim na saúde e na doença conseguia se conectar
Entravam em prantos
Ficavam por alguns momentos
Agradeciam por estarem curados para nunca mais lhe encontrar
E o não tão jovem de trinta anos se sentia ultrapassado
Amores e paixões o consumiam, gastou o tempo do jeito errado
Não alcançou sonhos de riquezas e vendeu barato sua pureza
Pouparei você dos detalhes de tantos fracassos e tanta tristeza
Até encontrar alguém que sentiu uma ligação diferente
E decidiu por uma mudança completa para se tornar alguém decente
Amor o transformava em Super-Homem e não havia inalcançável
Mas o tempo lhe cobrou caro e ser ainda jovem era impossível
Apenas um homem totalmente perdido
Outra volta do relógio, outro fim de um ciclo
Se era o Homem de Aço começara a enferrujar
Eram outras expectativas que encontrara
E não havia nada que preparara
Para ser obsoleto e sua alma querer aposentar
Pois não era mais o mesmo quando chegou a trinta e três
E não sabia mais se na rua vazia seu sonho se desfez
Pois só lhe restara o amor romântico como algo para sonhar
Mas coberto por novas feridas não queria escutar
Que o mundo não girara ao redor do seu sofrimento
Quando viver sempre foi em primeira pessoa, lamento
Mas eu não desejo um dia a mais nesta terra habitar
Desisti de tentar tudo do zero, é tarde demais tentar me salvar
Agora desejava ser um homem esquecido
Lamentava tanto tempo ter sobrevivido
E a vida começava a lhe matar
De doença em doença, tratamento
Físico e mental comprometido, chegou o momento
De temer os dias maus que viriam lhe cobrar
Pois se sentia ainda pagando caro por estar aqui
E ninguém entendia porque sofria sempre que chegava a ouvir
Outro hino religioso ou por outro falso profeta aparecer
Mais um falso Messias e ele só queria se esconder
De conflitos políticos, religiosos, e o país em ruínas
Apenas queria uma borracha para apagar a dor que o domina
A tristeza de ser alguém e ter uma história para contar
Queria escrever estas linhas sabendo onde tudo vai acabar