Olhos vermelhos
De abandono
De história
De velhice
De meiguice
De tristeza
Patas longas
Dona da rua
Muitos anos caninos
E ainda procura
E ainda a ajudam
Eu apenas olho e lamento
E me paraliso
Queria ajudá-la
Queria adotá-la
Mas eu estou tão perdido
Só consigo sentir pena
Só queria lhe dar uns momentos de alegria
Mas eu os deixo
Por vergonha, medo, melancolia
É o meu egoísmo que sempre fala mais alto
E eu sigo em frente
Subindo e descendo morros
Lamentando sobre a própria inutilidade
Que talvez a morte não seja tão grave
De deixar esse mundo tão cruel e estúpido
Tão indiferente
A vizinhança lhe dá ração e água
Pelo menos
Tem poucas almas que sentem compaixão
E eu não sou uma delas
Porque eu sinto pena
E nojo de mim mesmo
Mas o meu ego é muito resistente
E sigo em frente
Me brindando com mais esse altar de vaidade
Tão frio quanto aquele pai de "Através de um Espelho"