O que um dedo representa
Ontem me feriram, atingiram-me o dedo indicador,
Logo o indicador, aquele que escolhe,
Desprendeu carne da unha, há sangue,
E o sangue, era meu ou o do inquisidor?
Da violência da carne separada da unha,
Carregada pelo algoz por sua alcunha,
Que porventura se desculpa a mesma,
Por um ato de violência sem sentença.
Já o condenado com sua sentença social,
Engole a ira ou parte dela, feral,
Balança o braço, com que justificativa?
Sendo que só machucou o dedo, qual o enredo?
O sangue vem, o sangue escorre,
Ele não pararia, mesmo se ele morre,
A olho nu a carne viva, a unha já enegrecida,
Qual sentimento lhe emancipa?
Os dentes rangem, a boca cala,
Cala a boca, tenta não falar nada,
Mas o que o dedo tem a ver com a boca,
O que é um coelho para uma loba.
O dedo pulsa, a cabeça capta a dor,
A angústia desse amargo sabor,
Mas qual motivo anda da sala para a cozinha,
Se foi só o dedo indicador a sofrer a sina?
É só um dedo, é só um dedo! Há mais dezenove,
Que se importa que se um dedo morre,
Nem é ele que lhe move,
Não me comove.
No contexto atual,
Uma agressão é agressão,
A depender do agressor,
Ainda mais, se há um “a”, quem é que vai acreditar?
Um dedo representa o mínimo,
Sacrifício necessário ao corpo,
Nunca vi ninguém morrer por um dedo,
E que morreu se encontra morto.
Um dedo indica, ainda mais o indicador,
É a porta de entrada para saber,
Saber a medida do agressor,
Mas quem olha o histórico, não vê condenação.
O que um dedo representa, é a primeira permissão,
De como reagiria o agressor, ao sofrer uma agressão,
É seu convite para intentar, mas não contra o pudor,
Aquele que disfarça qualquer ira, apenas com louvor.
Ninguém se satisfaz com um dedo, nem mesmo uma unha,
Ela desce, ela cresce, se desfaz e faz novamente,
Tudo por uma consciência da mente,
Sem olho por olho, dente por dente.
Um dedo é indício suficiente,
De achar ter permissão, achar ter razão,
Que um ato de violência, cura a sofrência,
E não é de sofrer por amor que vos digo.
Mas um dedo é um sacrifício,
São ossos do ofício,
Que de um dedo sacrificado,
Para ter faz eu daria o braço.
Pode falar, pode chorar, tentar se arrepender,
Mate o humano de cada dia, cure-se de você,
Um dedo não impede o progresso,
Nem retarda o retrocesso.
Um dedo violentado, por amor ou por mal trato,
Por acidente ou por momento,
Não corresponde ao instituto, não o justificaria,
Eu não ficaria.
Mas se leu até aqui e um dedo não lhe ressignificar,
A quem você se identifica não é o agredido,
Pois nos olhos do agressor,
Não houve qualquer dor.
E mesmo que ínfima a dor física,
Vindo de alguém que se não espera,
A dor sentimental é expressa,
E se expressa violentamente.
Em latu sensu, é só um dedo, ainda mais o indicador,
Em strico sensu, o ato de um agressor,
Por raízes ou por sua própria semente,
Escolher a violência é ato de um coração doente.