desesperança, uma carta

olá, meu amigo

o tempo se esvai e a distância se aumenta

com minha memória cada vez mais turva

procuro as palavras corretas para lhe informar

sobre coisas mundanas

que não mais lhes dizem respeito

com meu estado cognitivo decaído

escrevo como criatura fraca e efêmera

para me enganar e tentar encontrar

sentido em respostas que nunca

obterei

mas insisto, cansado e insone

em buscar de sua presença em momentos e objetos

é um torniquete para um sangramento que nunca cessará

é uma medida temporária para suportável tornar

estes momentos que persistirão

até o momento onde memórias e tempo não mais

farão diferença

mas do azul ao redor do castanho eu me lembro

com eterno amor por sua sobriedade

das palavras nunca ditas eu me lembro

com eterno ódio daqueles que as calaram

são sentimento sem direção

são sentimento insípidos

é o desespero diante da inexorável

ausência de sentido da consciência

nada disto deveria existir

um erro gravíssimo foi cometido

sobre o qual continuo pensando

o qual continuo analisando

sabendo da jornada inútil que se consiste

o vento acaricia meu rosto e carrega consigo

para longe

todo meu objetivo com estas palavras

toda e qualquer mensagem que gostaria de transmitir

a ninguém

perdida

deixo então para qualquer desafortunado

ao se deparar com este texto

a simples constatação de que apenas a escuridão é garantida

que apenas a tristeza é constante

e a melancolia e a fúria nos destruirá a todos

sem que qualquer memória exista sobre qualquer ocorrido

no eterno transcorrer do tempo