Adeus Amigos

Quantas e quantas vezes tive que me ajoelhar

Para o dono do armazém da esquina

Se não quisesse chegar em casa e apanhar

Minha memória era minha triste sina

Quantas e quantas vezes também me ajoelhei

Para não ser expulsa da única casa que conhecia

Embora, a felicidade, ali, nunca batia,

Mas, pelo menos, na rua, não me criei

Quantas e quantas vezes chorei,

Pois minha mãe estava doente,

Mas meu pai era todo sorridente

E o preço do ódio, fui eu quem paguei

Também me lembro de ter ajoelhado

Para minha colega devolver o caderno

Que eu havia emprestado

Em troca, fui parar no inferno

Que maldição, ainda estou ajoelhada!

Tudo, para me manter empregada

Enquanto meus inimigos dão risada

E, aqui, vomito minha ira engasgada

Pela primeira vez sorri,

Recolhi do chão, meus joelhos achatados

A crueldade foi tanta que enlouqueci

E a loucura deixou meus dias contados

Adeus amigos, não voltarei a perturbar

Adeus amigos, aqui nunca foi o meu lugar

Adeus amigos, minha alma em paz no infinito

Adeus amigos, esqueçam que eu existo

Meu coração está prestes a rasgar o peito

Encontro-me amolecida em meu leito

Que a náusea não me acompanhe no além

Já que, a vida inteira, dela, fui refém

Há tantas coisas que eu queria ter realizado

Tantas outras, eu daria tudo para ter apagado

Mas, nem de tudo, vejo-me arrependida

Não me saí nada mal como aprendiz da vida

Não deixarei carta de despedida

Em alguns, ficará a dor desmedida,

Em outros, a alegria da minha partida

Saio da minha vida, de cabeça erguida

Quem quiser, acenda uma vela por mim e ore

Quem não conseguir segurar, tudo bem, apenas chore

Quem quiser, está convidado a cuspir no meu caixão

Tanto faz, já estarei a sete palmos abaixo do chão

Adeus amigos, estou indo para não voltar

Adeus amigos, aqui nunca foi o meu lugar

Adeus amigos, fiquem contentes por mim

Adeus amigos, meus joelhos estão livres, enfim