Escassez
A cabeça enrosca, dá um nó
Já não lembro se minhas lembranças são reais
Ou se foi tudo criado, servido, inventado
Neste jantar de 3 atos, de tantos pratos
Finjo apetite, paladar refinado
Na falta de etiqueta, me sobra tato
Percebo ironia em sintonia com a moralidade
Degusto o sangue fervido, engasgado
Nada demais, já acostumado, rumino verdades
Dias escuros, olhos vermelhos, insônia diurna
Eclipse solar, calendário lunar, inebriante
Suprimido ar desajustado, de ressaca miúda
A escassez que transborda em meus braços
É a mesma que ajeito, deixo de lado no prato
Me faltam palavras, me sobra sanidade
Na ausência de amor próprio
Me agarro à migalhas, olhares alheios
Fervilho ao efeito do álcool, peito inerte, sóbrio
Ao fim do jantar, me despeço, agradeço o convite
Regresso ao lar, meio despido, meio rebite
Desnudo no corredor, conduzo o corpo, e asilo a alma.