Casa própria
O corpo é casa própria do espírito.
Me habitar requer esforço, uma dedicação descomunal na tentativa de me manter em linha reta, sem devaneios ou tropeços. Evidente, a minha falta de habilidade, considerando as quedas dos últimos anos.
O caos de viver em primeira pessoa me tira o sono, ser casa de alma tão amargurada tem seu preço, o telhado já não aguenta tanta chuva e as janelas permanecem amareladas pela tristeza.
Me habitar transcende a fadiga do cotidiano, por vezes ressalta o egoísmo do ser, quando as infiltrações internas me perturbam mais que o furacão no horizonte. Habito um corpo frágil, embora resiliente.
No entanto, habitar também dispõe dos gracejos de uma vida, nem tudo é lastimável, afinal de contas.
Singela a poesia, que faz a alma levitar e a estrutura ter calafrios, amável o alento de um abraço terno em uma tarde interminável.
Nem tudo é lastimável, somente o abandono do corpo, a fuga do espírito e a venda da casa.