a última dança
eu me importo demais e não sei como não ser assim.
talvez esse seja o meu maior problema:
eu me importo demais.
com tudo e o tempo todo.
é cansativo ser assim.
sabe aquele pequeno detalhe, insignificante,
que muitas vezes passa batido aos seus olhos?
então, ele é bem importante para mim.
alguns dizem “vá viver”
mas como se vive quando se está à deriva?
passei toda a minha vida como telespectadora dos outros.
fascinada pelas inúmeras declarações de amor dos amantes.
ansiosa pelos encontros e elogios repentinos dos felizes,
das ligações de madrugadas dos enamorados.
fora os inúmeros romances presentes em minha prateleira.
eu sou uma especialista no amor
sem nunca ter sido amada de verdade por alguém.
fiquei tanto tempo fora dessa dança romântica
esperando pacientemente
pelo momento em que me convidariam para dançar.
sem ser por que eu fui a última escolhida
mas por simplesmente quererem dançar comigo.
talvez eu possa ser uma boa parceira de dança, afinal.
todavia, aí dá meia noite, a festa acaba,
os pares são desfeitos,
as pessoas vão embora,
as luzes se apagam
e eu fico ali, esquecida no canto.
na escuridão, sem ter dançado uma única música se quer.
eu volto para casa rastejando os passos no meio fio,
me sentindo a criatura mais solitária do mundo,
com a melancolia ameaçando tomar conta de tudo.
me questionando o tempo todo
“será que ninguém me viu?” ou
“a iluminação não ajudou para que alguém me notasse” ou
“acho que esse vestido não ficou bem em mim”
ou talvez
no arrebentar do fiozinho de esperança
eu só não mereça nada disso
uma dança e um amor.