Versos de Misericórdia
Versos de Misericórdia
I.
Teus olhos, minha donzela da decomposição,
Penetravam meu corpo como ganchos afiados,
Rasgando-me a pele, fazendo-me gemer agoniado
Lamentando tuas palavras de terrível rejeição.
As tuas garras sombrias, ó meu amor indigesto,
Mergulharam na minha garganta, faringe adentro,
Fazendo-me vomitar todo o meu alento,
Deixando apenas teu desprezo como o resto.
Os espinhos da tua pele, negra como teu silêncio,
Cortaram a ingenuidade da minha epiderme.
Gritar-te a minha dor tornou-se meu vício néscio,
Quando vi minha carne alimentar o teu desejo de verme.
Você me espancou, meu amor, sem remorso ou cerimônia,
Jogou-me no chão, chutou-me com deliciosa violência.
Cuspiu no meu cadáver sem nenhum tipo de parcimônia,
Deixou-me à beira a morte, poupando benevolência.
II.
Somente quando, humilhado, implorei o suficiente
É que lançastes sobre mim teu olhar de misericórdia.
A hipnose da tua íris, cintilante como lua crescente,
Afastou e fez valer toda dor, toda ânsia odiosa.
Sobre o mar do teu olhar não existe austeridade,
A negritude da tempestade torna-se doce acalento,
Os sentimentos, agora em terra, não são lamentos
E tudo isso vem sob a luz da tua santa piedade!
Ah! Teu doce abraço! Teu tenro afago de amizade!
Como bálsamo divino, fez curar meus ferimentos.
Teus braços me acolheram no olimpo da tua cumplicidade.
E a tortura, se um dia existiu, explodiu em mil fragmentos!