Indigente

Ela sentou-se na beira da cama

Nua

Acendeu um cigarro

Fumou uns dois maços

Olhou para o corpo ao seu lado

A pele queimada de sol, agora fria

O que ela fizera?

O que ela faria?

Vestiu sua roupa

Olhou-se no espelho

No seu rosto, o desespero

No seu pescoço, a roxidão

Na sua perna, um arranhão

Em um ato consolador

Cobriu o corpo com um cobertor

Soltou um suspiro meio infantil

Não usou a porta, pela janela saiu

Chegando na rua

Encontrou uma viatura

Eram quatro da manhã

A essa hora?

Deve ser puta

Mexeram com ela, com um certo desdém

"Ei! Psiu! Gatinha! Você cobra quanto, meu bem?"

Se fingiu de bêbada

Se fingiu de louca

Correu duas quadras

Coração na boca

Olhando pra trás

Ninguém a seguia

Respira fundo

Tá fora de forma, filha?!

É melhor parar de fumar

Nem sei por onde começar...

Voltou pra boate

Lar, doce lar

Parecia cansada

Sua roupa rasgada

Como ela ia explicar?

Uma cara a aborda

"Cadê meu dinheiro?"

Então ele avalia

Seu corpo inteiro

Percebe as avarias

Do seu precioso cordeiro

A preferida da casa

Estava encrencada

Se metera dessa vez

Numa encrenca das brabas

Não sei o seu nome

E nem onde morava

Tô só repassando, a história contada

Sobre o corpo na vala

Submerso nas águas

A peruca rosa

Ainda envolvia seus cabelos negros

As marcas roxas, agora cinzas

Cobriam seu corpo inteiro

Tinha mãe

Tinha filha

Mas ninguém queria saber

Era a renda da família

E esperava um bebê

Hoje ela virou estatística

Tá famosa na TV

Foi acusada e condenada

Só por se defender

Juliana Bruns
Enviado por Juliana Bruns em 24/08/2021
Reeditado em 25/10/2021
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