TEATRO DA VIDA
PRIMEIRO ATO
De um erro inocente e permitido, uma brutalidade cênica
Num plácido fingimento de amor, foi dado à luz...
No palco extenso, grande e ruinosa é plateia criptogênica
Num único e destoante fato da fantasia mórbida da vida
Em segredo trágico da existência fática destinado à lida
Sem fantasias, sem sentimentos, com funesta maquiagem
Em meio a fresta da desgraça alheia, se traduz...
Um palhaço tosco, vago, inerente, em preto e branco...
Sem a graça, sem a benção, se produz em fingimentos
Momentos tétricos... Um foco errado... Aplausos sépticos
Uivos do malfadado cancro dessa peça méliuz...
SEGUNDO ATO
No perverso, derradeiro e único prazer de infante
À sua maneira encena a vida em istmo e captura triste
Com um sarcasmo que escarra à face delirante
Finge que morre, finge que vive, finge que existe...
Insiste em querer ser mais, talvez independente...
Palhaço em branco e preto, em solfejante canto
Encanta os entes da assistência atônita e ininteligente...
Aumenta e cresce...Jura e desaparece em meio à turbulência...
Latência de sentir e de encenar seu manto escuro e negro
Seu segredo à tantas revelado ao público, em puro pranto...
TERCEIRO ATO
A morte em vida... primeiro contato delirante da realidade
Na sua liberdade tosca a falsa impunidade
Destila a ternura, afeto, carinho, maldade pura...
Ignorância de sentimentos... propriedade da gélida amargura...
O público ovaciona! Aplaude! Grita em êxtase delirante...
E o Arlequim se emociona e chora... acreditando na mentira inglória
Alegra-se com a vitória sobre a cripta escura, fria, ópia...
Do próprio coração que ousou um dia, sentir, amar, viver uma mentira imprópria...
E com prazer se esvai, deixando escorrer seu sangue infectado na coxia...
QUARTO ATO
Opróbio público... vexame... silenciosas vaias escarnecedoras...
Dos sentimentos tidos, o amor platônico, findo e irônico pesadelo
Modelo de angústia, de tédio, para sempre preso no espelho d’alma
Acalma as intempéries... soluça as emoções contidas...
De que trato bom pode servir a vida? Suplício eterno...
Daqueles que vêm e passam, transeuntes que interpretam amargura sóbria
Impregnadas na ruptura do xadrez da ensanguentada lágrima calma, a morte
Cobrindo o corpo estático dos pensamentos impuros, da risada sórdida...
Cai a pesada cortina da exposição dantesca e mórbida da rotina...
Num julgamento insano... desumano, mas divino e certo...
Aquietando o coração, calando o peito, interpretado em fúnebre concerto...
O Hino da vitória certa, na derrota tida da sua existência escarnecida...
Ainda chora sua lágrima única e fiel, o vil palhaço que provou do seu amor o fel...
A traição! A exposição do erro... O mais profundo sentimento em desterro tão cruel...
QUINTO ATO
Vingança! Sua ambição escancarada e nua, sem pudores!
Na via de mão dupla, amores de face dúbia, de corações sinceros
Meros “amores-de-passatempo”, sem compromissos e horrores
Ligações mantidas ao vento, parcerias de contraponto e eventos
Um dia em cada canto, um encanto cada dia de espanto e rumores...
O palhaço em branco e preto, ora aqui, ora no mundo perdido a vagar
Em lágrimas de sangue vertido, gotas de ácido veneno empobrecido, chora...
Demonstrando no riso que agora amarelado... envelhecido e vago
A angustia de se ter entregue, de se ter doado por inteiro e vasto
Às mãos do ilusório sonho em frasco de alabastro, em laços de cetim encarnados
Com a certeza de ter, por tanto tempo, nos braços encerrado, o grande feito
De ter no peito, a dor de uma saudade eterna, do gosto do beijo dado...
EPÍLOGO
Sobe o pano da desgraça em veludo rubro e denso, no contrassenso da história
O dolo, a culpa, a sentença derradeira, define a punição na esteira dessa sorte
No veredito de culpado, na sentença da fria e derradeira morte...
Na evidência clara de uma clarividência de consorte em cumplicidade plena
Eternamente em culpa, definitivamente em parte ser culpado desse porte...
Esfinge de talento para o trágico e final, desfecho da câmara de sepulcro bestial
Retarda a retirada de um corpo inerte... do palhaço sem qualquer ponta de sorte
De branco e preto, em preto em branco encena e encerra a derradeira morte...