INFINITO LIMITE

Oh, peixinho,

Por que piscas teus olhos deste jeito?

Envolto na água que estás não vejo tuas lágrimas.

Na verdade, ninguém vê. A não ser tu,

Que as sente.

Oh, ser aquático rudimentar,

Por que paraste perto do vidro do aquário onde te encontras?

Será que teu olhar morto lhe fustiga a memória,

De alguma lembrança viva?

Viva e passageira como a onda do mar?

Sabes como vieste parar aí?

Lamentas que estás num aquário?

Ou tem saudades do oceano, onde navegavas?

Bem verdade que poderia ser só um lago, um riacho, um rio.

Mas pra ti, oh, grão de vida, tudo era oceano.

Agora, te limitas ao aquário.

Por que paraste de nadar, peixinho?

Lamentas por não estar no mar?

Ou tens medo de viver sem teu conforto? Sem tuas cercas?

Receias que, fora do aquário de agora, não saibas viver?

Será que terás preguiça de nadar mais e mais em maior espaço, competindo com toda espécie de cardume?

Te conformaste com tua redoma de vidro,

Que te protege de predadores,

Que propicia tua ração,

Que te mantém a salvo.

Mas de que? De quem?

Oh, peixinho! Peixinho!

Por que teus lábios se abrem e fecham,

Num ruído surdo de quem murmura embriagado?

Lembraste de alguma canção que fora entoada por um pescador ou marinheiro?

Mastigas o teu ar aquoso como comias o tempo passado,

Que te enchia, como o mar,

E como a água do aquário que também te enche?

Não és ingrato, peixinho. Bem o sei.

Tua memória é curta.

Os cientistas dizem. Dizem...

Porém, por que teu rosto está colado ao vidro?

Não sabias que havia um vidro?

Não sabias que teu conforto é prisão?

Não notaste que não era a mesma água?

É água, mas não a mesma.

Por acaso tua boca se abre tentando trazer a memória do palato o gosto da água salgada?

Ou a confundiste com o sabor de tuas lágrimas?

Oh, peixinho, por que choras?

É culpa o que tu sentes?

Ou dúvida?

Duvidas da realidade ou da tua realidade?

Estás abatido por que não sabes viver fora do aquário?

Não sabia que havia uma vida lá fora? Outra vida?

Acostumaste com tuas algas, comida, existência semi-colorida, onde só tu és rei?

No teu império de trinta centímetros.

Não sabes mais viver lá fora.

Não sabes. Nem podes. Não sobrevives.

Ainda haverá esperança pra ti, fora desse aquário?

E dentro?

Pobre peixinho

Acostumou-se ao aquário.

Dispensara o oceano.

Águas por água.

E agora...

Seu "muito" é feito de tão pouco.

Respira, peixinho.

Não te afogues em tua limitação.

Nada podes fazer, mas ainda podes nadar.

Segue o conselho dos cientistas e tenha mesmo memória curta,

E no esquecimento dos teus dias que se vão,

Apaga da memória toda dor,

Risca todo poema escrito em tristes bolhas,

Pois teu coração carrega todo o infinito do mar,

E creia que teu aquário,

Ainda é o oceano mais seguro para ti.

Leandro Severo da Silva
Enviado por Leandro Severo da Silva em 13/07/2021
Reeditado em 13/07/2021
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