Insuportável
Nesse baile de máscaras junino,
ouço a música e vejo os casais dançando,
alguns rodopiando na ilusão da paixão,
outros exibindo-se por convenção,
juras sendo trocadas entre estranhos,
enquanto me pergunto o que me resta,
a máscara oculta minha identidade,
dessa alma que sempre foi anônima,
desse coração que jamais bateu no compasso...
Não sou parte desse cenário de ficção,
dessa novela de diálogos entrecortados,
não integro essa multidão de aparências,
desvio-me dos holofotes que ferem meus olhos,
a penumbra dos cantos que me protege,
as janelas refletem o negro céu,
sou apenas um observador, um coadjuvante,
entre convivas que trocam sorrisos e flertes,
sussurram sedução e inspiram perfumes caros...
Não pertenço à essa alta sociedade,
sou um personagem representando,
dramatizando um roteiro mal escrito,
esperando o fechar das cortinas,
pois há muito não suporto mais,
ser uma peça rota nessa engrenagem,
nada mais faz sentido ou é importante,
ninguém mais é capaz de me alcançar,
estou cada vez mais distante de tudo e todos...
Só preciso partir,
sem dizer adeus,
tornei-me perito nisso,
sair pela porta dos fundos,
ganhar a liberdade das ruas,
encontrar um banco de praça,
encostar meu breve respirar,
congelar e adormecer,
para não mais acordar nessa realidade...