O enterro da Cotinha

O cemitério era tão pequeno

Que as sepulturas vomitavam cruzes,

Mármores e lápides escuras,

Em cima de uma terra molhada

Que escorria a tristeza dissolvida...

A mureta segurava o corrupio dos corpos,

E dos ossos húmidos e desligados

Que aguardavam mais um fétero.

Cova livre, funda e escancarada

Mostrava a sombra e o abismo,

Preparado para engolir a carne.

Os coveiros limpavam a testa

E as pás perfiladas, em volta.

Alguém lembrou o vazio de todos nós

E a certeza de morarmos ali um dia;

Terra do resto dos nossos corpos...

Caiu um silêncio breve e apagado.

O caixão foi suspenso pelas cordas

E as nossas mãos apertaram-se no vazio.

A descida foi rápida e impiedosa,

Até atingir o silêncio daquela morada.

A um pequeno sinal, começaram as pazadas;

Dum lado e do outro, breves e carregadas

De terra pesada, densa e vermelha...

O som lembrava uma madeira oca e seca,

Miseravelmente açoitada por aquela tristeza.

Mongiardim Saraiva
Enviado por Mongiardim Saraiva em 07/02/2021
Código do texto: T7178969
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