De todos os demônios, logo você?
Num lar de muros verdes,
Que portões pesados são presos por cadeados,
Consegue ver uma fraca luz noturna,
Dentre os vizinhos calados.
Uma rapaz sozinho na residência,
Tão fria malevolência,
Ele colocava a coberta sobre os pés,
Até um sussurro percorrer a madrugada.
Uma sobra curvada para passar por porta estreita,
Coloca a mão sob a parte de cima,
Olhos à espreita,
Cumprimenta o humano no sofá.
Em sua frente, paralisado,
Não mexia, queria não ter respirado,
O engolir seco era único som,
Seu sorriso, um dom.
Eles se encaram, ele morria,
Ele o assustava, o outro sorria,
Ambos hostilmente estenderam a mão,
Do demônio de outra dimensão.
A luz era de vela em noite tempestuosa,
Daquela alma sozinha e temerosa,
Quando a uma macabra sensação,
Aquele era seu carrasco, sua menção.
Os cabelos negros encantavam a criatura,
Olhos sob a chama nua,
Aquela pele crua,
De alma turva.
Estive aqui, muito antes de tu,
Vivia quando nem pensava em respirar,
Não precisa pirar,
Já tive inúmeras chances de te matar.
Só plateia,
Um homem só, alcateia,
Lobo faminto, sedento por curiosidade,
Lembra-te de toda a verdade?
Naquela porta, tropeçara ao chegar,
Chorava, me fazia gargalhar,
Na janela, teu primeiro encontro,
Na cama, se abriu, desmonto.
Na cozinha, especiarias, pratos, sabores,
No banheiro, banhos, gritos, choros e dores,
O quarto, sabores, amores,
Lembra-se ao fechar a persiana?
No dia que chamou e foi chamado,
Quando pensou que poderia ter acabado,
Não se afaste, chegue mais perto,
Sou teu dono, sou teu servo.
Naquela porta, trancado para fora,
Vezes esquecimento,
Outras, merecimento,
Traição, traidor, gosto de amora.
Aquela cor de batom,
Uma escura renda,
Cabelos molhados,
Na varanda, deitados.
Estrelas e bem dizeres,
Maldições e afazeres,
Bebidas, cansaços,
Cinzeiros e maços.
Por luas belas,
Eclipses solares,
Diurnos gritos,
Madrugadas lunares.
Casas e tempestades,
Trovões e vontades,
Serviu e foi servido,
Por copos, temido.
Desesperos,
Encantamentos,
Sarracenos,
Descontentamentos.
Lembra, aquele dia em especial,
Que meio a chuva, ligou para alguém sem igual,
Pois a resposta, lhe trouxe agonia,
Mas também, sorria?
Se fosse filhos, que mal teria?
Poderia alguma vez, fazer valer,
Aquele dente nos lábios,
Aquela poesia de sábios?
Quantos medos, cômodos escuros,
Nas paredes, silenciados murros,
Vezes que se cortou,
Quantas se amou?
Como observador, tenho questionamentos,
Pois nada me responde, não me contento,
A curiosidade fomenta até demônios,
Todos, feromônios.
Conhecer é viver novamente,
Por mais que sua alma tente,
Quebre a perna, quebre o dente,
Sorria, incontente.
Me pergunto, qual gosto teve naquela resposta?
Ou seu pensamento no silêncio,
Tampouco penso nas suas premonições,
De sua paciência, quais são as prevaricações?
Quero entender, que som faria se te observasse,
Qual o sabor dos lábios que fissuraste?
O gosto da faca entre a carne do pé,
Aperto do nó, sentido de Noé?
Me peguei, sendo interrogado,
Por uma sombra, ser inacabado,
Ele não me abala, me constrange,
Me seduz, me aduz, me tange.
Ele observou, vivências e carícias,
Meus prazeres, minhas malícias,
Sabe segredos que armários não contam,
Nem paredes ousam dizer,
Sabe o que fiz e o olhar que fiz dizer,
A secura dos lábios,
O suor no rosto,
Conhece as cicatrizes em meu torço.
É minha sombra, meu pesadelo,
Meu eixo, minha coleção,
Aquele cetro de dúvida do rei em meu coração,
Ele faz, ele corrige, participa e restringe.
De todos os demônios, apresentou-se devidamente,
Ele é o pior, o sentimento amargo,
Poderiam aparecer qualquer um,
Apareceu o que frustra minha metade,
O demônio mais cruel,
A incondicional saudade.
Peguei-me desapontado,
Por sentimentos alheios e incorrigíveis,
De silêncios tardios e noites mal dormidas,
Nem comida, nem prazer,
Fazem do meu ser,
Alguém que duvida,
Que isso é viver.