Confabulações

Gosto, como gosto de parar os olhos na parede
procurando entender seu olhar azul,
feito de fé, cor de esperança
e não naquele verde desbotado que nada diz.
Gosto de parar na hora, despertar no tempo,
sentir que posso retratá-lo em cada verso,
conservá-lo em um sonho
tocando-o em cada sinfonia.
Gosto de sentir, saborear este prazer
firme, denso, capaz de falar,
almejar e trazer descanso.
Gosto da vinda que não veio,
apesar de esperada, pronta pra festa
que tardou e não houve.
Gosto de me sentir absorto
rebuscando no nada o motivo para tanto;
um suspiro de dor sem ferida,
de um abraço vazio, não preenchido.
Gosto de procurar no espaço
aquele risco que talha algum traço,
um efêmero pedaço
no minúsculo momento de vidência.
Gosto de participar das quilométricas,
longas parábolas sobre você,
seu recital de vida com os detalhes,
os mesmos que nos fizeram.
Gosto, e como gosto de saber,
sentir que a vida curta,
pequena para tanto espaço de amor,
querer e aguardar cada dia, uma dor maior.
E eu gosto, saboreio a hora final
porque os ajustes não permitem,
ser possível contemplar a largada,
só para saber que fui.
E o que tanto gostei, de nada valeu
neste fio de esperança
chamada vida.