Corvo Rubro
Maldita seja a pestilência!
Que não me deixa deleitar da onisciência,
Por desta crença quebrada,
Sigo com minha existência desgraçada.
Tudo que queria era ter minhas brisas leves de inverno,
Não viver trancafiado nessa gaiola do inferno,
Vos que não veem as flageladas nas minhas asas,
Não passam de bichos que voam, Traças!
Logo eu o pássaro mais negro de todo o paraíso,
O que fiz logo eu para merecer isso?
Já não basta nas reencarnações anteriores o pavor do povo,
Quantas vezes irão esmagar meu ninho, meu ovo?!
Disse logo o pássaro branco que tenho medo de voar,
Logo eu que cheguei aos céus tocar?
Somente estou em um dia que as águas secaram,
E trouxeram um lado que pouco vos mostraram.
Aquele que o pássaro de fogo urge aos céus,
Que caça todos aqueles culpados pelo véu,
Tossindo sangue e maldições,
Engasgando-se com ódio e maldições.
Não vos culpo de enojarem-se com o Corvo Rubro,
Pois eu me acorrendo,
Me encubro,
Para não demonstrar o aprendiz de Buer.
Afinal, sempre reinará o Sol Escuro,
Aquele de brilho único e puro,
De todos os cadáveres em montes,
Sua cor favorita se tornou o Rubro.
Estou ofegante,
Cambaleante,
Mas não deixo cair o semblante,
Por mais que o vento seja cortante.
Hoje foi o dia de esvair a raiva acumulada,
Pois a sujeira não gosta de ser trancafiada,
A língua fala a pedido do Rei,
Por mais que seja ruim, eu sou, eu sei.
Ele é incompreendido,
Cediço dizer que reluta constantemente,
Filho de um Rei Destruído,
Mas achou que poderia considerar seu desejo ambíguo.
Lhe restaram pilhas de homens mortos,
Sussurros mórbidos,
Castelos destronados,
Reinos em areia, devastados.
Quem lhe resta para socorrer?
Porque ele é vento,
Mas seu cair lento,
É no colo da Terra em cimento.
Seus desejos tenta estrangular,
Pois não os pode liberar,
Sua sede é insaciável,
Ele não deixa de ser amável.
Poderia alguém amar um pássaro de bico rachado?
Um rei destronado,
Senhor de segredos sangrentos,
Poderia aguentar seus ventos lentos?
Estenda-lhe a mão que ele poderia vir,
Pousar, cheirar e sorrir,
Pois quem lhe deu o dedo de descanso,
Foi a Morte e seu antigo manto.
Ele só precisa que alguém levante suas penas com o dedo,
Não é ego, nem medo,
Só quer carinho e motivo de chorar,
Mas parece que é muito pedir, para amar.
Cheque embaixo de suas asas,
Veja se ainda estão em brasas,
Dê a ele os galhos secos no bico,
É um novo ninho, um dia do Fico.
Ele é a mistura de Escuridão com Desconhecido,
Ama águas turbulentas e ventos tranquilos,
Mas não se importa por brasas calorosas,
Costuma passear por nebulosas.
É a estrela que Deus persegue com os ventos,
Pois ambos são sempre sedentos,
Por conhecimentos,
Por sentimentos.
Acha que é capaz de tocar-lhe as penas,
Desistirá como os antigos mecenas?
É único no meio de centenas,
Passou por infinitas sentenças.
Dês de suas crenças,
Acreditara em amar,
Que é um remédio, a cura do mar,
Prevalece em seu coração pulsante o desejo de continuar.
Confiaria sua vida pelo pássaro da Morte?
Aquele que gritou na crucificação da estela do Norte?
Que farfalhou até receber um corte?
Amaria um pássaro sem sorte?
Com sua família colorida desabada,
Com suas amizades inacabadas,
Suas patas ensanguentadas,
Suas vidas passadas?
Por mais que encoberto de Carmesim,
Ele é sim,
Corvo Azul entardecer,
O azul que te seduz até derreter.
Sua confiança é cristalina,
Com sua cauda linda,
Penugens sempre a trocar,
Um novo dia a se amar.
Hoje foi somente o dia de carcereiro,
Dia que estava ferido, sorrateiro,
Lembrou de como era antigamente,
Mas esse sentimento se esvai constantemente.
“O ninho é sua proteção alada,
Os furações suas amarras e taras,
Seus sopros suas mil caras,
Seus sentimentos, seus defeitos, suas vitórias, suas falhas”.
Uma vez um sábio disse para mim,
Que tudo na vida tem fim,
Pois amar é um sentimento descomunal,
Por isso não morre,
É imortal.
Ele tenta ser melhor,
Por mais que não queiram ver,
Apedrejam-no até o pior,
Mas ele não deixa de crescer.
Ave Corvo Noturno,
Aurora diurno!
Teu símbolo ecoa ouro,
De paixão maior que Ouroboros.
Ele é parte da Trincada Trindade,
É o símbolo da fúria em verdade,
Pois se consegue a plenitude no calor,
Seja no rancor,
Seja no amor.
Ele deixou sair todo ódio de sua alma,
Hoje pode descansar em calma,
Não precisou se afogar,
Mesmo que o dia não veio lhe ajudar.
Não foi socorrido,
Mas não se quebrou,
Não sentiu desgraça,
Mas também não gostou.
Foi sozinho,
Pois é pleno,
Ele é cominho,
Demais para quem é feno.
Não almejaria o céu azul,
Nem o Norte nem o Sul,
Seus anseios são mais altos que a estrela de Davi,
Pois no céu,
Seus desejos não caberiam ali.
Ele procura o mais alto do mais alto,
A mão do criador calmo,
Procura os pés de seu Senhor,
Procura o mais puro amor.
Pois acredita que essa pífia criatura,
Poderia também ser amado,
Vivendo essa vida ele atura,
Quando a mais amada não atende seu chamado.
Tem que ter equilíbrio entre os cavaleiros,
Os verdadeiros,
Os primeiros,
Luz e Sombra Costumeiros.
Ele continua a não se abalar,
Nem a ele nem seus sentimentos,
Pois ele não deixa de amar,
Ele lembre de seus juramentos.
Não o teste,
Nem jogue peste,
Prove seu valor,
Sinta o seu calor,
Por fim e nada mais,
Antes que se enforque mais,
Viva até achar que é demais.