Hipócrita Divino XII: Penínsulas Glaciais
Cá estou eu nas mil e umas dimensões,
Sofrendo das minhas eternas sanções,
Sentindo o aperto da Caçadora de Corações,
Alvo de todas as minhas frustrações.
Estou entre penínsulas amargas,
Dentre vidas de pessoas amadas,
Das risadas de pessoas erradas,
Todas as minhas almas desgraçadas.
Como eu queria voar e alcançar o sol escurecido,
Mas minhas asas são filhas do Encanecido,
Estão minhas penas pesadas,
Pela chuva estão ensanguentadas.
Tudo que minha visão alcança são corpos,
De entes queridos nossos,
Puxando para a agonia eterna do só memórias,
Transformando nas palavras de escórias,
Uma vez disse que fantasmas não contam histórias,
Mas voltam para assombrar.
Então tenho que subir esses paredões de infinidade,
De modo que arranque toda a minha carne,
Pois de espírito parece que não sirvo,
Ou que a tentativa de subir,
Pareça que me atiro.
Sou senhor das insuficiências,
O maculador de decências,
Lembro-me do meu Sábio toda vez,
Dizendo que serei sozinho por toda uma viuvez,
Morte do meu amado amor próprio,
Que de ninguém vale o grito.
Foram pedidos de socorro que deixaram passar,
Enquanto o vento nas penínsulas vem uivar,
Vezes que caiu uma pena ou outra como caminho,
Mas que ninguém guardou com carinho,
Pois sou ser frio e gelado,
Filho ingrato.
Mas venho gritar a Deus como gritava ao prantos de sepultura:
“Desde já serei filho de cria tua?
Até quando me atura!
Me lança fora se sou morno,
Me considera um morto!”
Bate-se as garras e trinca-se o bico:
“Mas eu ainda grito!
Faço de minhas maldições meu hino,
Oh senhor das esperanças,
Me diga teus planos ou o motivo da aurora boreal,
Veja como tua imagem de obra prima bestial”
Abre-se as asas e farfalha sangrando:
Veja Senhor como estão as asas da tua imagem,
Como quebram os ossos dessa pequena miragem!
Mostro-te cada pena que foi pisada,
Cada fibra que foi esfaqueada,
Olhe o bico que tanto chama Teu nome,
Foi trincada pelo impiedoso homem!
As garras tremiam no chão arenoso:
Olha-te atento ao Teu filho asqueroso,
O quanto de sereno pega esse pequeno corvo,
Que dos olhos alcançou o céu e vis resplandecente,
Diga-me os segredos deste coração ardente!
Por que me feste filho do Ódio enamorado em agonia?
Qual o sabor desta minha sinergia!
Quantas lágrimas pode um olho chorar antes da Morte,
Qual o sentido de uma vida mal vivida presa ao tempo da Sorte?
Eis que digo na forma de trovador,
Quantas súplicas valem o meu louvor?
Minha voz não alcança a misericórdia do Teu tempo?
Por que ecoa em angústia meu socorro em Teu templo?
Tira-me todas as lâminas de tuas empunhaduras,
Castra-me destas vontades impuras,
Pois prefiro não sentir que ser negado,
Prefiro ser frio do que chamuscado!
Senhor de todos os senhores,
Rei de todos os Reis,
Por que dois maior que um,
Por que cinco menor que seis?
Sentes o gosto que minha boca tanto abre?
Que todo meu desespero me cale!
Eu não quero mais sofrer enquanto se diverte alma dançante,
Por acaso não achas coração em meu semblante?
Porque o sentimento tão inconstante!
Senhor da Guerra e Impiedoso,
Viste em mim a carne do ímpio?
Não sois eu rio límpido!
Bebi de mim mesmo e senti o Estige,
Até quando prevalecerá o enigma da esfinge!
Eu me desapareço,
Meu sonho padece,
Sou um sonho Dantesco,
O eu que me merece!
Até quando trarei farpa a mão que me protege da saraivada?
Porque não seguro a flor e sim a espada!
Seria mesmo eu o pior filho de toda palavra,
Que me sinto a ponto de ser a pedra depravada?
Eu subo esta penínsulas no frio glacial,
O feixe de quentura é quase que infernal,
Atravesso o caminho do destino que me fez,
Por que não me lançou fora de vez?
Quanto da Tua compaixão tenho tomado,
Quanto da Tua paciência tenho tirado?
Qual meu objetivo e o fim de minha ansiedade,
Quando poderei ser feliz de verdade!
Prometi a muito tempo a filhos que me colocou no caminho,
Até mesmo guardo o pequeno sininho,
Aquele que tocava e me alegrava,
Agora reproduz numa faixa sem parada.
Prometi a estes filhos ó fragmentos de Tua benevolência,
Mas porque meu coração anseia por violência?
Até quando dependerei de raízes falsas,
E poderei usar as minhas poderosas asas!
Sabes que sou servo e filho do Senhor,
Pobre e miserável pecador,
Indigno de todo esse amor,
Mas ensine a mentes egoístas que não sou Terra,
Faça-te o único Voto de Minerva,
Ensina que sou Ar,
Um coração de alto mar,
Sou pequeno sonhador,
O Corvo Cerúleo,
Ave que voa!
Não serei eu fogo,
Muito menos igual,
Pois mesmo cheio de falhas,
Não me fez comum,
Que não dá satisfação a homem nenhum!
Meu coração não é servidão e gratidão ao humano,
Nem mesmo ao egoísmo mundano!
Eu sou metafísico do prazer,
Aquele que ama por merecer,
A chama da ponta da lança,
O fio na escuridão,
Não danço conforme a dança,
Ame quem tem coração.
Então meu Deus, sabes que não é blasfêmia minha voz,
Só é uma oração atroz,
Que meu sentimento mais puro é a Ira,
Eu sou a eterna pira,
O fogo que queima gelado.
Sabes do meu coração e meu amor espinhoso,
O quanto meu tom de frases é poderoso,
Somente me agrada e agrado a Ti,
Pois nada mais me faz sorrir.
Que da minha súplica pode algum ouvido escutar,
Sabendo que sou assim, pode alguém me amar,
Vou voar mesmo quebrando e moído.
Esse ano prometi não morrer,
É só um novo amanhecer.
Quando percebi,
Já havia escalado este monte,
Consigo ouvir seu chamado,
Meu Mestre amado.
Te reverencio e me apresento prostrado,
Mesmo todo acabado,
Destruído e ensanguentado,
Que do meu coração maculado,
Bate um desejo indesejado,
Um sonho inacabado,
Mesmo de bico trincado.
Pois só desistiria se tivesse morrido,
Mas meu coração bate como a certeza de um recém-nascido,
Minha esperança vive como se eu respirasse,
E ainda respiro.
Eu sou o desastre de Deus,
Aquele que ama os seus,
Mas depende de quem quer voar ao meu lado,
(Ó Pássaro Amaldiçoado)
Pássaro Alado.