O Violinista

Respira e coloca o carvalho no ombro,

Respira, tira toda essa pilha de escombro,

Passa o dedo na corda afiada,

Igualmente a tua alma incontrolada,

É hora do concerto.

Raspa contra o instrumento teu sentimento violento,

Rasga teu machucado que recupera lento,

Destrói teu amor ciumento,

Quebranta essa parede de cimento,

É hora do conserto.

Mas de começo a única nota que toca é Dó,

Fazendo ecoar nessa construção abandonada,

Se repete em meu coração Só,

Trazendo tristeza a essa vida inacabada.

Eu coloquei a dor fora,

Até fingi ir embora,

Embora não me satisfaça com não,

Faz bem ouvir algum sermão.

É melhor uma voz que lhe aponta falhas,

Do que aquela que não diz,

Aquele aprendizado em ponta de navalhas,

Eu sou aquilo que faço ou nunca fiz.

São escolhas da vida e decidi tocar,

Mesmo que vá meus dedos cortar,

Cortam-se no brilho de estrelas do vasto nebuloso,

Pisam tuas pressões em crepúsculo ocioso.

Cortam-se entre os céus e ecoam notas,

Fecham-se janelas e fecham-se portas,

Atam-se a mim como cordas,

Mas não me deem limites pois nasci sem bordas.

Sou confidente do segredo da felicidade,

Pois até de mim escondo essa forma de ser,

Me escondi em morros de ansiedade,

Por querer o futuro que faço crescer.

Sou escravo da poesia,

Sou filho da heresia,

Sou amante da música melancólica,

Guerreiro da cólera.

Mesmo que tirem meu violino,

Não sai meu título de violinista,

Serei sempre o fio de linho,

Que desfia a roupa em listra.

Mas a vida conseguiu roubar meu coração,

Que só bate quando tem canção,

Sem instrumento, que há deu ser?

O que Deus quer que nunca me deixou morrer?!

Então eu grito o mais alto que meu pulmão alcança,

Que nota é essa que se desprende da balança,

Que se faça Sol,

E nunca me de Ré,

Me faça ser como Deus é.

E eu sinto quando minha voz alcança seu juízo,

Que eu sou o eterno prejuízo,

O Violinista maldito,

Que a maior maldição é ser bendito.

A minha alma queima,

Anseia por tua ceia,

Me semeia,

Me faz tão bruto quanto areia.

O grão de sentimento que em montanhas é deserto,

E de certo,

De modo esperto,

Me faz completo.

Quem vê confunde com a Lua,

Que dessa vida cruel tua,

Mostra cada cicatriz prateada,

Que ilumina mais que a prata.

Mas hoje meu violino encontra-se enterrado em terras estrangeiras,

Terra onde crescem tulipas costumeiras,

Vale de que todo vento encontra paz,

Mas que nenhum deles volta para trás.

Sou o Violinista,

Só que agora otimista,

E minha maior visão de amor,

É que toda essa dor,

Não é em vão.

Cada gota seja qual for,

Amor, sangue, água, lágrima de louvor,

Pode vir qualquer dor,

Vai passar.

Eu toco,

Eu canto,

Fico roco,

Aconchego em teu manto.

Minhas notas perpétuas,

De Só,

De Sol,

Mas nunca Dó.

Até quando vai a paciência de Deus,

Pois ele me dá um coração dos seus,

E eu torno a ruir,

Torno a quebrar,

Estou a destruir,

Mas a me encontrar.

Desse doce veneno,

Em dia de chuva mansa,

Respiro todo esse sereno,

Me muda,

Me solda,

Mas não me solta.

Deixe que minha voz alcance teu reino,

E teu reino desce,

Tua glória cresce,

Afastando toda peste,

Ele vem.

Ecoe e quebranta esse coração amado,

Por ela não há preço caro,

Não me deixe sem essa flor única,

Eu serei a tua túnica.

Para o meu amor espero ser levita,

Nunca Leviatã,

Porque sou teu em vida,

Até quando formos para Canaã.

Corvo Cerúleo
Enviado por Corvo Cerúleo em 12/08/2019
Código do texto: T6718124
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