Em decadência
Com cuidado,
Seguro o ontem
Em minhas mãos,
O hoje escorrega
E escapa pelos meus dedos,
O amanhã está fora
De qualquer visão.
Esvaneço junto à areia
Que cai em grãos no
Passar do tempo
Desta ampulheta,
Logo o ciclo estará
Completo assim como
Desejo que eu me torne.
Descarto de mim,
Jogo pela janela
Complementos ao
Aterro de memórias
Voluntariamente esquecidas.
Lembro antes de esquecer,
Despeço-me e peço perdão
Por toda a minha ingratidão,
Não fui capaz de conviver
Com esses fragmentos
De quem fui e o que fiz.
Nas luzes que refletirão
Em linhas e volumes
De seu rosto cheio
De lembranças agridoces,
Não o retratarei
Perfeitamente como
Eu costumava desenhar
Em imagens de pensamentos.
Não saberei o que é
Segurar a mão de alguém
E sentir que não há
Organismo algum no universo
Que esteja concebendo
O mesmo sentimento
De solidão compartilhada.
Não serás o centro
O qual orbitam
Meus versos,
Haverá um espaço
Em branco ansiando
O complemento de suas
Próprias palavras despidas
De vergonha e hesitação.
Sentirei a falta,
Assombrará-me a carência,
Porém não encontrarei
A solução, mesmo que ela esteja
Vagando pelos mesmos cantos,
Revistando os mesmos passados ou
Cultivando os mesmos futuros.
Estará na ponta da língua,
Não serei capaz de dizer.
Estará ecoando em alto som,
Não serei capaz de ouvir.
Estará me evocando uma doce nostalgia,
Não serei capaz de sentir.
Assistindo o deslocar
De todos os corpos celestes
Sem ter a ideia do que
Fora do céu a vida me reserva,
Sem o brilho que almejo
No envoltório escuro
De cada noite sozinha.
Com decadência,
Ouvirei o desamparar
E ver estas harmonias
Se tornarem imperfeitas,
O preço a se pagar
Por tê-las presente
Na vida que não pôde
Seguir corretamente
O complicado ritmo de sua sinfonia.