Passos do Peregrino do Sul
Um dia todo em completo hiato,
Um dia todo sem tato,
Um dia todo sem contato,
Um dia todo em porcelanato.
Andei o dia todo em pedra quente e esfalto pelando,
Cada passo que eu dei meu pé foi queimando,
Queria que fosse nostalgicamente em campo brincando,
Mas eu estava ocupado me procurando.
Meu cotidiano tem sido de barata tonta,
Caminhando confuso de ponta em ponta,
Eu estou em procura de dar conta,
Mas ainda são jornadas quentes e noite longa.
Pulo de pilar em pilar,
Procuro de lugar em lugar,
Saltito, saltito sem parar,
Qual o preço de me achar?
Piso em pedra, asfalto, areia, cascalhos,
Apoio as costas em Limoeiro, Laranjeira, Goiabeira, Carvalhos,
Imagino em nuvens, dragões, serpentes, elefantes, canários,
Conto minutos, horas, dias, horários.
Distraio-me todo dia de forma diferente,
Findo-me em opinião congruente,
Finjo emocionalmente estar contente,
Encontro-me liberto em corrente.
Passa chuva,
Faço curva,
Passa sol,
Banho em formol.
Já trilhei tantos passos até assustar com rastro de sangue seco,
Caminhando por ruas e atravessando beco,
Cruzando avenidas e rodopiando trevo,
E nesse sol de meio dia eu fervo.
Procuro qualquer motivo que vire entretenimento,
Procuro qualquer motivo que passe o tempo,
Procuro qualquer motivo que engane meu tormento,
Procuro qualquer desculpa para dizer que "eu tento".
Eu cansei de ser peça dessa farsa,
Pois sou muito caseiro para essa praça,
Sou muito conteúdo para essa mentirosa carcaça,
Tudo que eu quero é ir pra casa.
Ando tanto em círculos que é quase infinito,
Ando tanto em círculos que parece um mito,
Ando tanto em círculos que o pé perde o atrito,
Ando tanto em círculos que já não sinto.
Dei tantos passos que não consigo mais contar,
Dei tantos passos que dói do dedão ao calcanhar,
Dei tantos passos que eu estou começando a cansar,
Dei tantos passos que seria suficiente pra voltar.
Cadê, eu.
Cadê, você.
Cadê, teu.
Cadê, cadê?