MELHOR IDADE
primeiro as pernas, depois a mente;
e então a coluna, depois a mente novamente.
a pele é um mapa de uma terra triste,
a descoberta diária de uma nova dor inclemente.
os ossos visíveis através do tecido fino das mãos,
a sujeira acumulada debaixo das unhas longas e curvadas.
o cheiro de pele velha, terno mofado, remédio, arruda
e naftalina evaporada.
porque a velhice está mais perto do que pensas
e esta é a mais sórdida e perfeita das ofensas.
se não tiveres a sorte do céu logo poupar-te dos tombos
passarás os últimos e melancólicos dias implorando pela companhia dos pombos.
nada vês, porém pensas que enxergas adiante,
assim como teus ouvidos ignoram alto-falantes
e da tua boca as palavras caiam como os dentes,
e a voz se torne uma ridícula amostra do trovão de antes.
o esqueleto pontiagudo lançando arestas,
as orelhas enormes de um ente antediluviano,
o medo da morte, da solidão, da perda de si mesmo
e a certeza de que pesas tanto quanto um piano.