Sinto-me a me afogar num mar de garras
Sinto-me a me afogar num mar de garras
que seguram meu corpo ao mais profundo
fundo sob o som triste de cigarras
que exercem, como pérfidas amarras,
a força de um penar perene e imundo.
Lanço, aos berros de medo, um passo em falso
que mostra que o profundo é mais embaixo
e estou plantado às brasas, pé descalço;
as cigarras ridentes do percalço
mais me machucam quando me rebaixo.
"Não te rebaixes!", mando, atroz, a mim,
com pavor das cigarras, e das brasas,
e das garras, porém ri-se o arlequim
de meu medo de flores de jasmim
e diz: "Tu próprio, de cegueira, os olhos vazas!"
Cigarras se fazendo joaninhas,
e garras se fazendo grama e flora,
e brasas se fazendo água e vinhas.
"Que há com inseguranças todas minhas?"
Ele fala: "Descrês na perfeição do mundo afora."
Mas morre minha débil esperança:
de debater-me, tudo o que ali estava
vê-se teve traída a confiança:
chorando, as joaninhas da bonança,
me imploram: "De nós puras, Mau, te afasta!"
23/05/2018
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