Vinho maldito
Dizem por aí que nossas lágrimas
regam o árido deserto de sensações perdidas,
que nosso sangue está pesado demais para circular,
que nossas vidas perderam-se no varal das indiferenças,
que nossos sonhos explodiram no último carro bomba,
e agora fragmentados escutamos sons confusos,
tentando reunir os pedaços de nossas almas tristes,
dissonâncias nas sombras de mil vozes gritando ódios,
ressentimentos que nos amaldiçoam dia após dia,
venenos que nos entopem as veias já atrofiadas...
Apáticos e cegos quedamos em concreto fresco,
vitimados por arco e flechas ilusórios,
pesadelos e delírios de mundos ociosos,
derramando clamores por salvação em igrejas vazias,
buscando não desistir na ventania que nos desnuda o espírito...
Dizem por aí que apenas um trago nos libertaria,
um sussurro de perdão na condenação dos eternos,
que nossas expectativas afundaram num mar de lama,
que nossas músicas foram silenciadas por censuras alheias,
que nossos sorrisos foram arrancados de nossas faces inocentes,
e agora vagamos como coringas insanos buscando um propósito,
tentando encontrar força para nossas fragilidades cadentes,
demônios dos medos que jamais expulsamos de nós mesmos,
amarguras num ciclo de infinitude e incompletude retumbantes,
cianureto em taças de vinho para serem degustadas à meia noite...