epílogo lilás
o céu lilás
repleto de pequenas nuvens
brancas, pálidas
esparsas
a revelar a tarde morrendo
os pássaros em revoada
procurando abrigo, água e
alguma paz
imersa naquele imenso lilás
a flor do campo
que brotou brutalmente
bem em cima da pedra,
num chão árido,
e tórrido
aonde não seria possível
nem brotar pensamento
no mais denso nevoeiro
onde sombra e luz se confundem
formam imenso túnel
embaçando
a visão, sentidos
e confundindo os medos
o choro compulsivo,
o soluço e a tristeza
de perder um amigo
um copo de café quente
forte, negro
vindo do pilão dos escravos
a ladainha das lavadeiras
e o rio com seu cochicho
a sibilar segredos de
quem tanto trabalhou
é hora de morrer
é hora da perda
de se enterrar
um corpo
é hora do desenlace da alma
mas nada irá sufocar as
lembranças, o afeto
o brilho do olho do amigo
que lhe estendeu a mão,
que lhe sorriu
que lhe confortou
numa dor, num tropeço
ou num desatino
é hora de morrer
sob esse céu lilás
e os pássaros arribaram todos
depois que lhe cobriram a
cova
as flores murcharam um pouco
a pedra perdeu seu brilho
e a fenda da solidão
arreganhou-se mais um pouco
para abrigar mais uma ausência
ou mais imagem que será
apenas saudade
que tristeza é vê-lo partir
mas que alegria é vê-lo
caminhar para luz,
a luz de todos os dias,
de todos espíritos bons
a luz que nutre de esperança
o epílogo da vida.