ESCURIDÃO

Somos todos reflexos do meio.

Sem forças me sinto incapaz

De no submundo estar em paz.

Meu suicídio é matar-me,

A minha identidade;

É perambular por aí

Sem mais pensar nesta cidade.

É estranho, como me afundo

Em pântanos de lodo de mim

Quando perdido nos labirintos

Desta Babilônia.

Quando estava ausente

O ato de respirar e de estar aqui

Tinha uma consistência diferente,

Algum sentido, ainda que vago.

Na verdade nunca estive ausente,

Talvez para os outros,

Mas nunca escapei da presença

De mim mesmo,

Ou do que acho que sou.

Tanta coisa a gente pensa que é,

E às vezes percebemos

Que não passamos de uma presença

Que observa paciente e silenciosa

A confusão do ser.

Ando reclamando da vida,

Me lamentando em segredo,

Blasfemando quanto à tudo

Que dizem ser sagrado.

Babaquice me lamentar,

Todos carregam esta dor tamanha.

O fato de conseguir

Dar alguma forma à dor

Não significa nada.

Sou mais um,

Mais um neste inferno.

Sofro me matando com tabaco

E arrastando odor de fumaça

Por todo lugar onde passo.

E, se passo, é arrastando também

Esta carcaça de vida,

Jovem e já cansada de tudo isto.

Já experimentei tanta coisa assim

Para nada mais me deixar eufórico?

Tudo é chato!

Quero saber desta quarta dimensão

Que é pra onde falaram que eu iria.

Baboseira! Estou aqui!

E estarei por aqui até que

Esta coisa que criou tudo decida,

Ou que eu mesmo decida.

Talvez basta querer me movimentar,

Viajar, dormir em chão duro,

Correr algum perigo,

Não saber o que vai ser de mim,

Cair na porrada com o Desconhecido.

Isto é muito mais vida

Do que esta vida na cidade,

Na minha casa,

Na minha cama.

Tenho basicamente

Tudo que preciso

E não estou satisfeito com nada.

Há dias eu não durmo direito,

Há dias não me emociono

Ao tocar violão.

Há dias só quero

Que passem os dias.

Só quero passar,

Cair no esquecimento,

Desistir de ser alguém

(nem sei o que é ser alguém),

Desistir de competir,

Desistir de provar as coisas

Pros outros,

Desistir da aprovação dos outros.

Sinto estar matando

A minha doçura,

Já até estou aprendendo

A ser grosso

E a falar não para os outros.

Deus, o que estou me tornando?

Ah, sou momentos!

Sou estados de espíritos que surgem

Em cada momento.

Sendo assim, nada sou de definitivo.

Há dias o sol se esconde da cidade.

Há dias acordo e vejo apenas neblina.

Não tenho visto as cores da vida,

Nem gosto mais do vento me tocando,

Ele se tornou tão gelado!

Sinto chegando o inverno,

Ele chega no mundo fora

E no meu mundo dentro.

O sol nasce escondido

Pelo céu cinza

E estou indo tentar dormir.

Procurei a Lua, luz da noite,

Também não encontrei.

Tentei acender a luz de casa

Mas ela havia fugido.

Tentei encontrar a luz,

Que encontrei algumas vezes

Perambulando dentro de mim,

E ela também não encontrei.

Quanta escuridão

Se apoderou do meu espírito!

Até quando risco um fósforo

Para acender o meu cigarro

O vento frívolo e incisivo

Apaga a breve luz da chama

Como se blasfemasse da luz

E zombasse da minha perdição.

Quando a gente blasfema

A Natureza blasfema da gente.

Quando a gente chora

Todo o Universo chora conosco.

E quando a gente cria,

Mesmo que algo triste,

A Vida só responde

À altura do que sentimos.

Estou farto.

Só peço ao Sol

Que pare de se envergonhar

Do que criou

E seja mais piedoso.

Já não peço por mim,

Eu que tenho me escondido

Tal como o astro rei,

Mas peço à ele

Que devolva a luz aos homens

Por mais ingratos que sejam.

Sei que a Vida é generosa. (Sei?!)