O Apagar
Que a cada poesia apagada
Seja ela feita pelo descaso
Na simetria do inverso acaso
Não sofra na heresia relatada
Pois ela vive até na escuridão
Tristurosa realidade
Portentosa consciência
Escravizada pelo abandono
Como uma existência sem dono
Demonstre que nada é perdido
Se for guardado um pouco do nada.
Ela verte de todas as vértebras
Pulsa com o rancor da ausência
Mas ela retorna a mente franca
Que um dia ela quis que branca
Fosse diante do embaçar interno
(e que se fosse externo seria mesmo)
Ainda que o tempo de viver a esmo
Demonstrasse desonestidade
De viver de cegueira e insanidade
É uma arma voltada ao coração
Onde quer queira quer não
Trata-se da única ação e reação
Que nem mesmo a fortuna se apieda.
Mas não adianta que o poeta
Arca com as suas maldições
Tais o arfar das maledicências
De tantos males e suposições
Está uma alma perdida
Desbotada e descolorida
A espera de uma dor renovada
No silêncio do sofrer alheio
Que nem quisera que acontecesse
Que por mim sofresse
Ao menos tentaria amortizar
Mortificando amor
Entre os diversos paladares
Que somente a poesia
Abraçada a sinestesia
Possa proporcionar nos ares.
É uma lei do retorno
Apagar da vida
Ser apagada ou suprimida
Um brinde ao desvairar
Um deslinde a pairar
É um prospecto avisado
Sem medo de ser revisado
Ainda que seja cedo
Talvez tarde esteja
Para transformar em recado.