Porta fechada

Escrevi essa carta.

Ou poesia.

Para justificar tantas coisas.

Mas nada justifica nada.

Tudo é tanto e,

ao mesmo tempo coisa alguma.

Há muita nuvem dentro do olhar.

Há um infinito esparramado nas entrelinhas.

Há signos procurando uma semântica.

E a semântica caçando a tiros os signos.

Errei o alvo.

Errei o tiro.

Errei na vida.

Tropeçei publicamente

nas escadas suntuosas dos castelos.

Fui nobre e campesina.

Fui bruxa e artesã.

Mas demasiadamente humana.

Por pecar, errar e recomeçar.

E por humanizar as coisas.

Teci meu destino na trama fatal

que me legaram.

Com o pouco que me deram

Consegui muito.

Ou talvez apenas o improvável.

E, tudo isto só foi

sobrevivência.

Engoli enxovalhos.

Sofri calada humilhações.

Levei surras e

tive três costelas quebradas

Doeu nos ossos a decepção

de confiar em quem não deveria.

Paguei com o corpo

os erros do espírito.

À você espero ter lhe transmitido

geneticamente o gosto de estudar,

O amor aos livros, à poesia insensata

e generosidade compulsiva

de dar sem esperar nada receber.

Dar é intransitivo.

Não combati uma guerra justa.

Pois não existe guerra justa.

E todos os guerreiros são fascínoras e

anjos ao mesmo tempo.

A cambalear na corda bamba

das conveniências.

De você queria receber amor e devoção.

Ou ao menos lealdade.

E mais uma vez, não consegui.

Mas, afinal, o que é o amor?

E o que vem a ser afinal devoção?

Talvez o amor seja um ritual secreto.

E a devoção uma dança da chuva.

Ou será uma dança do fogo?

A queimar a esperança daqueles que

não mais esperam...

Eu cansei de tanta porta fechada.

De números rindo de minha singularidade.

E dos abismos imensos e inexplicáveis.

Agora, quem fecha a porta sou eu.

Agora, quem ri do cotidiano

Sou eu.

Ri por último.

Mas rio sozinha.

À luz de vela no meio do quarto

escuro.

Sem saber o que vem depois.

Essa é a minha porta fechada.

Que abrirá a todos

um novo caminho.

o da redenção.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 08/10/2013
Código do texto: T4517015
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