Choro

Choro lágrimas que queimam

Ardem minhas dores

na pira do tempo

Gotejando pela janela d’alma.

O carvão sórdido da quietude.

Choro infernos contidos,

edificados em pilastras,

escadas e burburinhos

Choro em tridimensão,

em plástico, em concreto e

em lirismo replicado

numa impressora a laser.

Choro copiosamente.

Com os mesmos olhos

que procuravam a luz

Ou perdoavam as trevas.

Choro porque falta-me as palavras

As metáforas morreram

por serem óbvias

As metonímias morreram

por serem sub-reptícias.

As aliterações trairam

todo alfabeto.

E as sílabas desesperadas

diante do abismo

Arremessaram

toda a semântica fora.

Que soavam

como fonemas torpes,

Chora-se por falta de razão.

Por excesso de razão.

Por falta de simetria.

Porque o perímetro não nos incluiu.

Porque o diâmetro nos corta ao meio.

E meio a tudo, sentimo-nos

tão nada.

Choramos para fingir que ser triste

é biodegradável.

Choramos discretamente na sala

bem ao lado do espetáculo

dantesco que tem como cenário

nossa conivência.

Ecologicamente somos trágicos.

Caçadores, dizimadores de etnias, raças,

animais, sentimentos e valores.

Matamos para dominar.

Matamos.

Dominamos apenas para

saciar nossa infinita sede de poder

e luxúria.

Choramos porque lutamos.

Porque perdemos.

Porque ganhamos.

Choramos

pois precisamos desidratar...

Retornar enfim ao pó,

e ao áspero tecido

de nossos enigmas.

E a carne apodrecerá junto com

os mesmos devaneios que

nos fazem chorar.

A lágrima diliui tudo.

o sólido, o imaginário e

o intangível.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 27/09/2013
Código do texto: T4501216
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