Carta à tão distante sobriedade

Ainda sabe que me forço, constantemente, à necessidade de expressar-me?!

É porque sinto este vazio miserável – o labirinto do caminho incerto e covarde.

Isto me frustra, não por arquétipos, estereótipos ou o coágulo da ganância:

Esta decadente quintessência de minha inexorável condição humana,

Mas porque tudo em mim anda e desanda nesta mesma poça de lama.

Conformando-me por – e com – esta derradeira vil insuficiência.

A correnteza da complacência, o real estigma da vida humana –

Esta condição maldita que, em mim, também grita e reclama,

Ainda impreca em alto som que a imaginação onírica é pobre, é patética.

Que a intelectualidade, a lucidez lógica, é o caminho das divindades;

Que o impossível provável é a única via das supremas verdades.

Ah... Estas razões que sempre chicoteiam os que não são da estética.

Agora, ser virtuoso para quê se passa de largo de algum valor?!

No absurdo que completamente estou, extraviar-me sem qualquer pudor,

Passa deveras rente ao norte não-humano que, imóvel, tanto admiro.

É onde espero algum dia aspirar por não contentar-me estar à borda:

Ao somente lógico e ilógico, que me expia, acorda-me e me desdobra,

Somente porque brilha forte aos tolos sonolentos que tanto deprecio.

Ouço gritos dos silêncios advindos do manicômio social onde moro.

Desesperado, vejo os corpos anestesiados pela dor – e eu os devoro –

Gozarem somente a austera angústia da solidão sombria das pálidas noites.

O céu negro os alfineta – e como vodu feito pela vida, também as sinto todas

Através do meu ridículo sorriso – o mesmo que diariamente me vira às costas:

O carrasco vil e cínico que me causa agonia em cada intermitente açoite.

Perceba que não há dia, para mim, sem que eu acorde sem este cardápio

De prostitutas que vendem alegria nas esquinas, que é o meu ópio.

Que sempre me é entregue às mãos pela cruel megera, a metafísica -

Esta sem definições que, todos os dias, me persegue, fere-me,

E esquece-se da cura graciosa que, mesmo quando não se merece,

Galga a cavalo sem precisar receber – ou ouvir – a minha súplica.

Na pressa, corro para minha paradoxal sensatez temendo cair e me machucar.

Dou passos além de tudo, mas nesse nada permaneço por apenas chorar.

Ah! Sempre – mesmo em prantos, inconformado e anestesiado – muito escutei

Que esta insignificância incomensurável em mim, a vida derramou por castigo,

Por vivê-la assim, desnorteada, indefinida e decentemente sem abrigo.

§ Sem perspectivas – Cláusula Pétrea contratual do meu diabo... E eu assinei.

EA
Enviado por EA em 06/07/2013
Reeditado em 22/03/2016
Código do texto: T4374917
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