AURA AURÍFERA

A incerteza corrói a alma

Mancha a cândida memória

Nada que seja mortal acalma

A dor de ser tão inglória

Nos suspiros brotados do meu peito

Foge a seiva dos dias divinais

Infeliz, teus conselhos eu rejeito

Então não resta-lhe fazer nada mais

Corras ao cemitério

E prepares meu sepulcro

Sinto-me no meio etéreo

Não retorno ao mundo escuro

Mandes para todos os viventes

Uma cópia de meus poemas tão singelos

Para que saibam, entrementes,

Como é viver no flagelo

Somente as rosas hão de velar meu passamento

Elas, quietas nos campos

Suas pétalas, a cada momento

Revelam, da vida, o encanto

Que todos festejem, alegres

Pois a Terra, enfim, se livrou

Deste verme, corroído e inerme

Que ao final desta luta entregou

Entreguei a centelha da vida

A quem faça um melhor proveito

Regada a vinho, minha vil despedida

A faço sem nenhum respeito

Peço-te um último favor

Não esqueças de na laje cravar

Um epitáfio feito de dor

Como este último suspirar

Aqui jaz o corvo solitário

Ligéia, Atena, Kali

Que na vida não teve sossego

Na floresta, em paz, a dormir...