O último solilóquio de um suicida
Sob estes galhos de figueira,
Chego aos limites das dores que me assolam.
Cansado dos inexorabilíssimos trabalhos,
Pergunto-me os motivos, ânsia,
De suportar um mundo hostil que apenas nos debilita.
Preso à ilusão de felicidade,
Que me abstém a coragem de buscar um mundo melhor,
Que flui pelas entranhas do desconhecido.
Suportando esta existência miserável,
Na ilusão de um futuro incerto,
Que nos faz masoquistas,
Carregando o fardo de uma realidade funérea
Sob as cascas de feridas que são abertas a todo instante,
E nada mais nos oferecer.
Para suportarmos um presente que,
Ironicamente, era o futuro de ontem.
O vento me acaricia a face, inexpressiva,
Mergulhada na profunda melancolia,
Soprando em meus ouvidos,
Em cantigas de lamentos, uivando,
O adeus à minha existência nefanda.
Os pássaros cantam em despedida, tristes,
Lamentando pela minha existência,
Talvez, por não compreender as belezas deste mundo.
Da vida nada mais quero, somente a paz que repousa os mortos
No seio da morte, mergulhados no esquecimento,
Os espíritos afortunados pela essência do não-ser,
Dormem, serenos, na paz da eternidade.
Caminhando por cacos de vidro,
abrindo as feridas que foram curadas ontem
Sagrando minha existência pelos caminhos da vida
Deixando o rastro de sofrimento, no escarlate intenso do sangue.
Chego ao meu ponto de parada, sorrindo,
Feliz, por deixar este mundo lúgubre.
Me prendo a esperança às correntes da mortes,
Incerto, ao que me espera quando fechar os olhos
Mas à vida já estou habituado,
E me agarro à morte desconhecida,
Pois a esperança brota do desconhecer,
Sendo a última morrer e nos levando junto dela.
Sentado sob a sombra desta figueira velha,
Observo a natureza com volúpia,
Proseando comigo mesmo no silêncio dos sofredores.
Deixo a vida que me foi concebida sem meu livre arbítrio,
Escolho a morte como um direito de escolha,
E encerro minha participação no teatro da vida.
És chegada a hora da vida me retirar
Chamo-a, Oh morte, onipresente, me acalente em seus braços
Sufoque esta dor no limbo do desconhecido
E leve-me para o mundo daqueles que já se foram,
E daqueles que ainda não nasceram,
Que repousam no seio do nada neste exato momento,
E ser-me-ei confundido à morte,
Aos olhos daqueles que ainda vivem...