Convida-me a dançar...
O inverno lembra-me sempre a fome...
A fome que eu sinto de todos os raios de sol sobre o meu corpo cansado.
A fome de todas as vidas que poderia ou poderei eu ainda viver...
O inverno lembra-me sempre a fome...
A fome de todos os desejos ardentes nossos sobre a minha cabeça que só, pensa.
A fome de todos os gozos que eu poderia ou poderei eu ainda desfrutar...
Não vim ao mundo para comer... não dessa fome.
Eu comeria a vida! Tenho fome de vidas... tantas...
Nem vim ao mundo para dormir demais... perco eu o meu tempo.
E sou eu tão atemporal quando olho-me no espelho de mim.
E és tão feito de tempos e relógios e manias... e fomes de comida e sono.
Deve ser por causa desse volume de coisas que os humanos inventam...
Brinquedos malvados e tolos... regentes da vida... senhores!
Eu não tenho nenhum senhor... Trago sonhos! Muitos!
E bater o ponto e ter que correr com uma porção de papéis nas mãos...
Que nem, de facto, sabe-se onde quer-se chegar... que loucura!
Que loucura de maravilha deveria ser o Jardim do Éden... Sinto saudades... E sou eu mesmo uma "descontrolada" e não gosto nada de pontos, nem de ponteiros, nem de tempo. O tempo é o meu tempo e os meus desejos todos que chegam junto com ele.
E não gosto de luz... dessas que ficam penduradas nos tetos... e prefiro a luz da lua...
Não ofusca... não ofende... não solicita-me nada e ainda convida-me a dançar.
Não sei sentar-me e escrever algo assim... de última hora.
Gosto mesmo quando versos de outrém chamam-me a dançar... ou a lua...
A dor também chama-me a dançar... elegantemente... nos versos meus.
E o inverno?! ... Lembra-me sempre as saudades todas...
E lembra-me a fome... e eu comeria todas as saudades minhas!
E regurgitaria todas elas em palavras de amores... todos perfeitos e com finais felizes.
O inverno... lembra-me todos os amores... é isso.
Eu não gosto do inverno... faz-me chorar...
Cái sobre mim com suas mãos trêmulas... e engana-me que quer-me afagar...
Quer-me mesmo maltratar... de frios... de saudades... de amores...
Com mãos cálidas... e quase gentis... e pousam molhadas sobre mim... abraçam-me...
E eu... quase gosto... quase gosto.
Mas olho à minha volta... e desfaço o sorriso do quase gosto...
E sinto... muito. E choro.
Convida-me a dançar… cheiro de chuva na terra…
E deita-me a descansar de tudo… no meu regato…
Karla Mello
24 de Janeiro de 2013