OH QUANTA DOR!

Te conheci num momento triste e esquecido,

quando o céu estava sombrio e desestrelado,

também desprovido desse luar,

contudo tão melancólico quanto um olhar desiludido.

Guardei nas lembranças o teu perfume afável,

teus gestos de abandono e de saudade,

teus olhos nadando em lágrimas, fortuitas,

tua voz perdida num amargo desafino,

talvez sonhando em fazer tantas coisas

Talvez ansiando realizar tantos belos feitos.

Não, nada, nunca, só a brisa em desespero

rasgando a mágoa das ruas, levantando poeira,

respirando sobre folhas, roçando teu rosto cansado,

revolvendo sem entusiasmo os teus cabelos finos

Que eram negros como uma noite apagada.

Tua ias sem rumo à procura de quê? Do talvez, decerto,

dos senões imiscuídos nas entranhas do porvir,

do mutismo solitário, doloroso, angustiante

Querias algo que provavelmente nem sabias o que fosse,

e te perdias enfim nos próprios passos trôpegos,

parecias flutuar num céu mágico e misterioso,

como se levada somente pelo pensamento ensandecido

Teu ego se perdia no coração do teu cérebro eunuco.

Choravas e sorrias ao mesmo tempo, cantavas até,

e eram pobres músicas mórbidas como chuva de granizo

destruindo telhados, como fogueiras chamuscando o ar fresco

Lembravam flores murchas esvaindo sobre brasas ardentes,

como sendo desprovidas crianças inocentes alardeando

o clamor dos tantos famintos por seios túrgidos,

por carinhos vis, por abraços que jamais seriam dados.

Quisera não ter sido assim o nosso mórbido encontro,

tão imerso nesse poço sem fundo de incertezas,

de inesperada e desesperada falta de esperança,

de repentino lufar de gélidos suspiros de dor

De desnorteadas e retorcidas lantejoulas flamejantes

brilhando sinistras nos lacrimejantes pingos

que caíam dos teus olhos e lambiam o chão empoeirado.

Oh, quem dera, quem dera! Sim, quem dera, sim!

Ah! fosse de maneira mais sublime esse nosso encontro

em que passasse por nós um rio de ternura e nos molhasse

com seu ar celestial, gorjeassem pássaros felizes sobre nós, cantarolassem melodiosos anjos em festa

Ao nosso derredor, dançassem as pessoas felizes

transbordando e distribuindo oceanos de felicidade

como se fora o primeiro dia de inesgotável paraíso

se abrindo inteiramente aos nossos corações.

Todavia não foi assim, não houve fascinação,

não se ouviram estrondosas gargalhadas de alegria,

ninguém beijou ninguém, afagos não foram feitos,

carinhos caíram por terra ressequidos pela falta de desejo

Risos se transformaram em choro alucinante

sobraram temores e tremores, corpos não se fundiram

não houve intensidade do gozo, mãos não se pegaram,

não foram trocados efusivos nem fracos cumprimentos

A simpatia fugiu dos olhares e se transformou em pesar,

em esgar, em incertezas, em loucos vislumbres de ódio

destilado sem qualquer razão plausível.

E todo mundo chorava sorrindo um sorriso sórdido

Todos se lamentava mesmo sem haver sentido para isso,

corriam sem saber aonde iam, abriam os braços em cruz

e gritavam "engula-me solidão!", jogavam-se ao chão

e rastejavam feito serpentes famélicas prestes ao bote

Preferi não gozar o céu da tua boca com um beijo de língua,

não chegar nem perto de ti para não ser contaminado

com o alarmante ar lúgubre estampado no teu rosto,

preferi afastar-me em desabalada carreira, fugir de ti

Fui chorar meu próprio lamento, subir nos telhados úmidos,

tentar voar o mais alto possível para ficar bem longe de ti.

Achei por bem não abrir as portas do meu coração

ao apelo desvairado e mortífero de tua tristeza.

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 08/09/2012
Reeditado em 08/09/2012
Código do texto: T3871596
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