No Forro da Malinha...

Exilada de mim… te dei tudo e escolhi. Eu.

Avessei e desvivi. Que dia é hoje e que lugar é este?

Sufoco histórias minhas tão reais…

“clareio-as” com uma borracha que comprei em Itu.

Esqueço tudo e me dou… mas decidi hoje que não quero ser flor

Ora rega-me… ora rego-me.

Este vai e vem… lembra-me o barulho estúpido do relógio.

Lembra-me o tempo perdido e o que urge.

Choro. E hoje quero ser dor.

Dói, não vês?

E hoje resolvi gritar e chamar palavrões

Ficar “de boca suja” e “descabelada” e chata…

É quando estou lúcida e tanjo todos os passarinhos e borboletas azuis.

E tiro a flor dos cabelos. E o meu anjo da guarda ora.

Amanheci avessada de fazer-te gostos e esquecer-me de mim

Das tuas roupas e meias e manias.

Surpresa!... Também sinto desgostos… muitos!

Tenho uma coleção deles e estou atrasada no quesito perdoar

Atrasada… não sei se seria bem isto… vou reformular depois.

Cansada… cansada dos teus atropelos sobrepostos ao teu destempero

Sou temperada demais. Sou “insana” e muito livre

Papai sempre disse-me isto.

Engraçado… todos gostam mais da menina que reside em mim.

Eu também, até. Mas eu sou uma mulher.

E gosto do tanto faz… mas apenas quando o desejo

Quando desejo o silêncio que queres-me ocupar

Dá-me licença… faça-me o favor!

Eu existo. Respiro. E não preciso de ti

Penso. Erro. Caio. E já bem antes ti em mim

Mas não demoro muito a levantar-me

Tateio no escuro e encontro a saída

Estou cada vez melhor nisso.

Por isso… tenha cuidado comigo

Levanto-me silenciosamente… não faço alarido

Lembre-se: Sou muito amiga do silêncio.

E dentro de mim… também sou o escuro da noite.

Lembra-te dos meus pés cortados?

Pois bem. Já os são mesmo.

Caminho em qualquer chão e não carece ser reto.

Reto… só o meu caminhar.

E mesmo “trôpega”… caminho reto.

E mantenho a classe… e invento asas nos meus pés cortados

Também posso perder esta mesma classe em fração de segundos.

Depende mais de ti… do que de mim.

Sou afinada para a vida… e não tente desafinar-me.

Não conseguirás… porque sei “matar-te” em mim

Por amor a mim. Ahh… eu merço! …

Já atravessei a fase da auto-comiseração faz muito tempo.

Ando sempre atrasada para a vida e não tenho mais tempo para este capricho.

Portanto… Silêncio.

O perigo ronda-me. Ele ronda-te.

Tira esta venda dos olhos teus… torpo homem.

Vê se enxerga-me para dentro e a linha do limite… entre mim e você.

E passa na livraria… e compra uma lupa.

Mira-te ao espelho com ela. Engole-a.

Olha-te para dentro. Demora.

O teu envólucro é fascinante e o teu quarto de ti é muito bagunçado.

Grita pela janela afora… ao mundo!

Mas não venha ditar-me regras tuas e conceitos teus.

Eu os respeito todos. Mas não os imponha à mim.

Venha com calma e faz-me um cafuné… posso ceder

Mas cedo a você quando eu quero.

Tenho todos os meus conceitos e regras que acumulei

E não foi na modista… nem ensinou-me a professora de etiquetas

Nem no colégio de freiras… de lá, que não mesmo…

Ahh… estas baboseiras todas fazem-me rir!

Exijo respeito e existo. Dá-me licença.

Não guardo apenas a caixinha de lápis de cera e sonhos bons.

No forro da malinha há mágoas e solidão… um bloco e uma caneta.

E sou amiga do silêncio e, de ti, não espero nada

E respeito muito as marcas do meu rosto e mais ainda as da minh’alma.

Esta é a parte para não esquecer.

O resto… pode esquecer. Eu mesma lembro sozinha.

Perco sempre os meus óculos… mas tenho a "memória de elefante".

Dá-me licença. Perdi a paciência. Cala a tua boca.

Seja bom maestro… eu permito a você reger-me

Tocas-me… mas não estica muito as cordas.

Eu… posso partir.

Karla Mello

Fevereiro/2012

Karla Mello
Enviado por Karla Mello em 17/02/2012
Reeditado em 05/10/2017
Código do texto: T3504268
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