TRISTE ALMA
"O sono da razão produz monstros"
(Francisco de Goya)
Ó triste alma, como irás limpar-te desta mancha
Ignóbil mácula que lhe polui o ser atormentado
Negra nódoa indelével, infâmia que se engancha
Nos refolhos do íntimo de um espírito macerado.
Lastimável colheita da despreocupada invigilância
Ceifas pútridos frutos onde semeastes o desprezo
O cálice de amargores de que mantiveste distância
Transborda e sufoca o sentimento mantido preso!
O fio de seda que te mantinha atada à realidade
Tornou-se um pesado e atro grilhão de chumbo
O doce unicórnio que embalavas com serenidade
De súbito transformou-se em monstro iracundo!
Pobre alma a fitar o céu, súplice, as mãos erguidas
Não pode evitar a insondável voragem que surge
Abrindo-lhe sob os pés um terrível abismo sem vida
Não soubeste utilizar o tempo que corre e que urge!
Onde estava a razão, quando tu devias ter feito uso?
Agora padecerás sem previsão de termo pra tua dor
As sombras serão tuas companheiras, como um intruso
Da vítima acercando-se, a confiná-la em medo e pavor!