Irônico

Eu sei que as cartas se perderam no vento,

as folhas misturaram-se ao movimento do sopro,

as letras dançaram e escorreram pelas folhas nas gotas de chuva,

cada verso dito tornou-se um não-dito maldito

a caligrafia caprichada caiu no veio do esquecimento,

o tremor da natureza lançou a frágil cômoda ao chão,

espelhos quebrados, relógios com ponteiros tortos,

agora tudo parou dentro dessa caixa de música travada,

não há mais notas ou compassos que alimentem um amor quebrado...

.

Eu sei que as poesias foram deletadas naquela noite de mágoas,

um blog que deixou de existir depois de quase dois anos sobrevivendo,

mas as trevas de turbilhões de sentimentos confusos prevaleceram,

e vencidos fomos pela ingratidão da escuridão da indiferença...

.

Eu sei que o ipod foi trocado pelo ipad e o HD lançado à reciclagem,

o que lembrava nós dois deixou de ter sentido físico ou virtual,

viramos fantasmas assombrando memórias em amnésia induzida,

entre flertes, romances, novos recomeços, dramatizando um devir,

artistas de nossa própria dramaturgia particular viciada em dor,

morrendo à cada dia na ausência do amor que enterramos no oceano,

eis o que somos e o que fingimos não ver todos os dias no espelho,

soprando bolhas de sabão em dia de sol à pino em jardins floridos,

sorrindo como tolos de nossa própria ignorância de escolhas feitas...

.

Eu sei que as rimas foram choradas quando a consciência retornou,

para depois desaparecer na curva de uma esquina qualquer,

bebendo as lembranças no alívio de um copo de álcool destilado,

um brinde à nossa hipocrisia tão brilhante no caos de nossas vidas de brinquedo...