Cansado.
Estou cansado pelas paralelas de uma vida tão pouco saudável que me atinge.
Aonde eu vou, parece que as pessoas cismam comigo só porque eu não sorrio à toa.
Mal sabem elas que tenho cáries nos dentes, tenho mal hálito e, só de chegarem perto, afastam-se de meus tecidos.
Apanho calado de quem nem conheço. Mesmo com uma foto, não reconheço. Eu sou reconhecível aos passos silenciosos.
Eu sou sensível a um lençol que nem me cobre todo e, com isso, sinto frio entre minhas pernas.
Eu sou o choro do socorro, mas, ao me alcance, vejo a sociedade de braços e pernas cruzadas.
Eu era o combustível de tentar. Hoje nem tento mais, lamento os passos mal terminados.
Eu era determinado a tantas coisas. Eu era determinado a sorrir, mas minha cara fechou, minha barriga cresceu, meu sonho desapareceu.
Estou barrigudo de tanto me locomover em um sofá. Tem pipoca, servido? Só não tem refrigerante. Eu nem bebo “refri”, meu refrigério seria uma adrenalina que contém pouco açúcar. Mas nem bebo mais açúcar.
Hoje contemplo só o armado, talvez seja a explicação de eu ser tão antipático.
Nem respiro mais na janela. Ela ficou emperrada junto às minhas esperanças de um sonho de criança.
Parei no tempo. Deixei o tempo do relógio parar, tirei a pilha e descarreguei a bateria. Nem olho mais para o sol, pois tenho medo de me queimar .
Vivo num mar onde sinto o constante perigo de me afogar. Aliás, estou sendo afogado pelas mágoas de um oi sem sorriso, de um olhar de um sem graça.
Que graça eu teria sendo que meu trabalho não é ser palhaço? Sou uma espécie de mal amado, mal humorado... Eu sou o que as letras estão descrevendo. Não sou divertido, não estou num parque de diversões. Odeio montanha-russa, odeio a roda gigante que a vida é. Odeio os prefácios de ignorância que exploram minha forma de viver.
Eu sou aquele que não nasceu para agradar e ser agradado. Talvez seja um ingrato, mas, de ingratidão em ingratidão, estamos quites. A vida é ingrata com todos os seres e nós somos ingratos com Deus.
Eu reclamo, mas nem mereço. O que faço para merecer? Apenas respiro um ar poluído de ignorância. Um ar sem amor. Um ar que sufoca.
Estou, então, vivendo num sufoco onde nem acho mais meus pertences em minha casa. Procurei nos armários, guarda-volume e estante; A cada instante vi que não achei nada. Porque nada perdi neste mudo. Aliás, apenas perdi sim o meu sorriso.