Do ódio a exaustão

Odeio-te. Pois te esperei, atento e ansioso

Porque em cada movimento de porta que se abria

Eu, como um cachorro a abanar o rabo, mostrava-me esperançoso

Odeio-te pois apareceste em minha vida

E no final, odeio-me.

Odeio meus ideais, banais e descabidos que na tua lembrança contemplo

Porque nos devaneios de notívago construo em ti um templo

Que me mostra a impotência, a solidão, mas acima de tudo que não te mereço

Por fim, eu, em teu sorriso esmaeço.

E no final, odeio-me

Odeio o lindo rosto, o sorriso que brilha, a doce maldade no rosto de ninfa

Odeio o belo corpo, as mãos macias, incrustadas de belas unhas

Odeio a conversa, as idéias e todo esse nosso ensejo

Essa idéia de que contigo me identifico e em ti me vejo

E no final, odeio-me

Odeio querer ter voltado, te esperado

Transpor a barreira de ávido e invalido que sou

Ter te falado, do abalo profundo, do devaneio ao qual estou atrelado

Do pequeno desespero que me invade quando contigo não estou

E no final, odeio a todos que me dizem do contrario

Odeio todos que me falam de capacidade, inteligência

Odeio todos que ao meu lado se achegam para desabafar

Odeio todos que me pedem palavras outras que não as de violência

Odeio todos que me pedem para falar

E no final odeio-me

Odeio-te leitor medíocre. Pois te aproveitas de minhas idéias

Para ostentar uma aura intelectual que não te pertence

Não sabes o que é senso crítico, não pensas, tens diarréias

Odeio-te porque é a tua opinião que no final vence

E no final, encontro-me exausto

Cansado do egoísmo, da ignorância, do cinismo, do pseudo-realismo

Da ausência dos valores, da mediocridade, dos amores e todas suas dores

Da vaidade, da beleza da insanidade, de todas essa falsa piedade

Das quimeras, dos ideais, dos falsos marginais pseudo-iconoclastas e tudo o mais

Dos alienados, dos manipuladores, dos “coitados”,

Das mulheres e sua idéia de igualdade, da pseudoliberdade,

Dos homens e sua crise, de tudo que me dizem,

Cansado da sociedade, do governo, da humanidade

Cansado do discurso sustentável, do “mundo melhor”, da esperança inabalável

Da metafísica, da hermenêutica, de toda filosofia

Da política, dos grandes homens, toda essa balela ridícula

Do consumo, do sexo, do dinheiro, de estar sempre insatisfeito

Deste quarto pequeno e pavoroso, de minha solidão,

Deste emprego, desses patrões, desses padrões, desses paradigmas ladrões

Desta vida, da única mulher que me ama, dessa arma que me fita

Do cano gelado que em minha boca coloco, do tiro que disparo

Do sangue que jorra, da escuridão que se forma

Do corpo que cai, segundo derradeiro, vida que se va....